sexta-feira , 19 abril 2024
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Doença da “urina preta” pode causar insuficiência renal

Médico alerta que o problema é causado por toxina presente em alguns peixes

Nos últimos meses, ao menos quatro estados brasileiros registraram casos da Doença de Haff, conhecida popularmente como “doença da urina preta”. Os casos foram relatados na Bahia, Ceará, Amazonas e Pará. O quadro descrito nos pacientes com casos graves é compatível com a rabdmiólise, doença que destrói as fibras que compõem os músculos do corpo. Quando associada ao consumo de peixes, a síndrome é conhecida como Doença de Haff.

Quem falou sobre o assunto foi o infectologista Marcelo Galotti, em entrevista essa semana. Ele explicou a origem, sintomas e consequências da doença que tem assustado os brasileiros.

A doença foi descoberta em 1924 em um lago denominado Frisches Haff, na região de Koningsberg, local que antigamente pertencia a Alemanha e posteriormente foi incorporada a União Soviética. “Depois disso, teve alguns casos na Suécia, nos EUA e no Chile. No Brasil, pela primeira vez ela apareceu entre 2008 e 2009. Recentemente surgiu nesses outros estados, com um destaque especial para a Bahia, onde surgiram 72 casos”, disse o médico.

Presente no peixe

A enfermidade trouxe uma preocupação aos amantes da carne de peixe, aos pescadores e principalmente às autoridades de saúde.

“Os peixes que transmitem a doença da urina preta não são exclusivamente de água salgada. Entre os de água salgada, já detectados, são o salmão e o badejo. Entre os de água doce, temos o pacu, o tambaqui e o arabaiana (olho-de-boi). Não devemos esquecer que crustáceos como lagosta, lagostim e camarão também transmitem a doença”, revelou.

Toxina

Segundo Marcelo, a doença atinge o organismo de uma forma bastante abrupta, após a ingestão de peixes ou crustáceos contaminados. “Esses animais estariam com uma toxina, que não tem odor, não tem gosto, não é destruída pelo cozimento. A origem dela no peixe, não é conhecida. Alguns acham que é produto da decomposição de um peixe mal conservado ou de um crustáceo. Outros acham que ela vem de uma alga que esses animais se alimentam. Ainda não existe uma certeza absoluta sobre a origem da toxina”, destacou.

Algumas doenças infecciosas como tétano, botulismo, gastroenterocolite por staphylococcus, são doenças causadas por toxinas, e elas são contraídas por ingestão de alimentos onde essas bactérias produzem.

“Mas não existe nenhuma evidência nesse caso particular de que seja uma bactéria. Existem doenças bacterianas produzidas por toxinas. No caso particular da doença da urina preta, não existe nenhuma evidência da participação de bactérias na sua etiologia, o que nos leva a garantir que ela não é uma doença infecciosa. Não tem envolvimento e vírus ou bactérias”, ressaltou o infectologista.

Não é transmissível

De acordo com o médico, as dúvidas sobre a transmissibilidade surgem porque várias pessoas apresentaram simultaneamente a doença – sugerindo que aconteceu entre elas uma transmissão. “Mas o fato de várias pessoas adquirirem a doença em um mesmo período, é que elas ingeriram o mesmo alimento contaminado, e não que uma passou para a outra”, completou.

Para o infectologista, o que chama mais atenção é a forma de apresentação abrupta da doença. De duas a 24 horas no máximo, após a ingestão do alimento contaminado, o paciente começa a apresentar os sintomas. “Na fase inicial, ela acomete o sistema muscular esquelético, que é o sistema voluntário, ela tem predileção por este aparelho. Normalmente ela tem preferência pelo músculo do trapézio. A partir daí expande para o pescoço e ombros. É um sinal muito frequente em doença muscular, adormecimento e formigamento dessa região. Mas qualquer músculo esquelético pode ser afetado. A febre é raríssima nessa doença. Pode causar náuseas, eventualmente vômito, mas o que chama muito atenção é a fraqueza. Isso é na fase inicial”, explicou.

Quando passa para a fase secundária, de acordo com o profissional, ocorre o escurecimento da urina, que dá nome a doença. “Com a lesão da célula muscular esquelética, libera no sangue a mioglobina, pigmento escurecido que é excretado pelo rim, ele aparece na urina e chama a atenção. Normalmente é uma doença benigna, com mortalidade baixa, embora ela possa acontecer. Quando a pessoa falece, geralmente é pelo comprometimento do aparelho renal, acaba tendo uma insuficiência renal aguda. Mas é raro acontecer”, pontuou.

Diagnóstico

O diagnóstico da Doença de Haff é feito em função de sua patogênese, ou seja, modo como os agentes etiopatogénicos agridem o organismo e apresentam sintomas.

“Sabemos que ocorre uma agressão as células musculares esqueléticas. Com a destruição dessas células, ela libera no sangue duas substâncias – uma delas é a mioglobina, que é o pigmento escuro que já comentei, e a outra é a creatina fosfoquinase (CPK), que é uma enzima. É um dado adicional importante para o diagnóstico. Além da ingestão do peixe, dos sintomas abruptos, é possível dosar no sangue, o aumento dessas duas substâncias, que aumentam na vigência da doença”, informou.

Tratamento e prevenção

Embora não exista um medicamento que neutralize a toxina, é feito um tratamento de suporte que ajuda na cura do quadro. “Se fizer uma hiper-hidratação no paciente, além de diluir a quantidade de toxina no sangue, o que consequentemente diminui a agressão ao organismo, como você intensifica a diurese, acelera a excreção desta toxina. Esse tratamento é muito importante. Em uma situação grave, ainda temos o recurso de fazer uma hemodiálise”, disse.

“Quando falamos sobre prevenção de alguma doença, duas coisas se sobressaem no primeiro momento: vacina e soro hiperimune. Os dois têm como essência anticorpos, a vacina estimula a produção deles, e o soro contém esses anticorpos prontos. Infelizmente por não se tratar de uma doença infecciosa, fica muito difícil o tratamento de prevenção por esses medicamentos. No caso dessa doença, é adquirir alimentos em locais que se supõe que os cuidados de higiene e conservação sejam perfeitos. Com isso o risco seria minimizado”, encerrou.

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