sábado , 20 abril 2024
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Alunas do 5º ano do curso de psicologia da Unip falam sobre bullying

Bullying: problema é recorrente nas escolas locais

Estudantes de psicologia abordam manifestações do problema na vida adulta

Dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2021 mostraram que a prática do bullying ainda é uma realidade no Brasil. De acordo com o levantamento, aproximadamente 23% dos estudantes contaram ter sido vítimas da prática, sendo alvo de provocações feitas por colegas. Apesar do termo ter surgido na década de 70, quando o fenômeno foi nomeado pelo professor Dan Olweus, da Universidade da Noruega, a prática do bullying é muito mais antiga.

Mas você sabe o que é bullying? A ação se caracteriza por intimidação sistemática, quando há violência física ou psicológica em atos de humilhação ou discriminação. A classificação também inclui ataques físicos, insultos, ameaças, comentários e apelidos pejorativos, entre outros.

A prática do bullying é comum em todos os lugares do mundo, e se você nunca passou por isso, provavelmente conhece alguém que já tenha sido vítima desse tipo de agressão. A violência traz inúmeros malefícios para quem sofre, e também para quem pratica.

Essa semana, o jornal conversou com Márcio Ângelo Menardi, coordenador do curso e da clínica de Psicologia da Unip, e com Danila Pinheiro Menardi Tavela, supervisora do estágio de Psicologia Escolar da instituição. Além dos dois profissionais, alunas do 5º ano do curso de Psicologia, que estão desenvolvendo o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) intitulado “O Bullying infanto-juvenil e suas manifestações na idade adulta”, também estiveram presentes para falar sobre este tema tão recorrente, principalmente nas escolas.

Márcio é psicólogo da educação municipal desde 1988, e iniciou a entrevista falando sobre a aplicação da psicologia nas escolas, especialmente em casos de bullying.

“Nosso principal objetivo é a relação entre escola, família e criança. Essa questão que envolve esses três pontos, passa por diversas queixas, variáveis que compõem a realidade desse tríade. Um dos sintomas que mais se tem atualmente nas escolas, infelizmente é o bullying, que é marcado pela inexistência de uma igualdade social. Temos uma sociedade que permanece dividida de suas classes e valores, e há uma tendência de rejeitar ou não aceitar as pessoas que são diferentes, independente da natureza dessa diferença”, relatou.

Bullying nas escolas

As escolas municipais, que envolvem as EMEB’s, atendem crianças de no máximo nove anos de idade, Márcio falou sobre como as escolas em conjunto com os psicólogos, costumam lidar com as agressões no caso da faixa etária referida.  “Quando ocorre uma situação de bullying, envolve-se sempre a família, os professores, a escola como um todo, procurando sempre através do diálogo, da técnica reflexiva, evitar que o agressor também se torne vítima dele mesmo, porque nesse caso ele é uma criança, que também não pode ser estigmatizada socialmente. É um trabalho feito de forma integral, considerando a saúde mental até mesmo do grupo no qual o bullying acontece”, comentou.

“A criança que desencadeia o bullying, assim como seu grupo de amigos, merece uma atenção especial no sentido de limites. Mas sempre visando a integração. Jamais visando o afastamento, porque são pessoas que estão em construção”, completou.  

Segundo Márcio, a incidência do bullying é muito grande na faixa etária entre 8 e 9 anos de idade.  “A partir dos oito anos, a criança se sente como alguém que erra, ela identifica que não possui todas as características ideais, e que ninguém possui. Essa capacidade dela identificar seu próprio procedimento, faz com que ela acabe se auto avaliando. Geralmente quando isso acontece e ela pertence a um meio ambiente mais flexível, a aceitação é muito maior de suas próprias diferenças e desigualdades. Já quando ela percebe de forma rígida, porque pertence a um meio que possua essa qualificação mais rígida, ela percebe seus próprios erros dessa forma, e apresenta uma tendência a ter um conflito de ordem individual ou grupal. Algumas crianças têm a tendência de se tornarem mais tímidas, tentando esconder aquela característica que não é muito legal na concepção dela, outras crianças tendem a mentir, o que é outra resposta associada a partir desse julgamento”, relatou.

De acordo com o psicólogo, a idade social ocorre aos dez anos. “A criança que passa por toda a evolução, sendo capaz de superar algumas marcas, consegue atingir a idade social. Então ela entra na adolescência bem. Quando ocorre algo que não está muito harmonioso nesse processo de auto avaliação, a criança acaba levando essa marca para adolescência.  Por esse motivo, dos 8 aos 17 anos o bullying é algo muito forte. Embora alguns estudos mostrem que no Ensino Superior ele ainda existe”, destacou.

As humilhações, os desajustes, e a sensação de que a pessoa não é aceita, pode desencadear uma impressão errônea de que a sua vida não vale a pena. “A sensação de desigualdade e a humilhação podem gerar uma tendência depressiva, e infelizmente desencadeia em alguns casos um desajuste de comportamento que pode levar a uma certa agressividade, ou casos que envolvem até ideações suicidas, que levam a um sofrimento muito elevado”, completou Márcio.

Bullying infanto-juvenil

O TCC “O Bullying infanto-juvenil e suas manifestações na idade adulta” está sendo desenvolvido pelas alunas Aline Merxed Peres, Angélica Cristina Mancini, Ivana Maria Pereira, Juliana Alegreti Silvério, Lídia Antunes Nicácio e Maria Isabel Borges, e tem o objetivo de mostrar as consequências do bullying na vida das vítimas, após atingirem a idade adulta.

“Estamos estudando e buscando informações sobre o bullying na infância e na adolescência. Segundo nossas pesquisas, existem muitos relatos de bullying na adolescência, onde ele é muito marcante.  Muitas pessoas que sofrem com isso, apresentam problemas como ansiedade, depressão, traumas, e até mesmo há consequências para a fase adulta da vida, pois algumas pessoas adquirem dificuldade em se relacionar com outras por conta do bullying sofrido no passado. Elas passam a ter dificuldade em confiar nas outras pessoas, e encontram até mesmo problemas no trabalho”, explicou Angélica.

“Existem casos de crianças que sofreram bullying na infância e até pararam de estudar, e agora na fase adulta estão retomando o ensino no EJA, para recuperar o que perderam. Algumas pessoas também sofrem com bullying por estudar no EJA, tudo isso desencadeia vários problemas, seja na vida adulta ou infantil”, disse Aline.

Angélica contou o motivo de ter sugerido o tema do Trabalho de Conclusão de Curso, que as colegas, acolheram em comum acordo.

“Eu sofri bullying na adolescência, e colho até hoje as consequências disso. Estou superando, mas conheço muitas pessoas que sofreram com isso. Sabemos como é isso na pele, como isso nos faz mal, mas também entendemos a importância de superar. Todo mundo conhece alguém que já sofreu bullying”, destacou.

“Este é um tema atemporal. É um problema que sempre vai existir, infelizmente. E precisa ser abordado”, disse Aline. 

Sintomas e características

Segundo Angélica, as vítimas do bullying podem apresentar diversas manifestações pela pressão enfrentada, até mesmo sintomas físicos. “As pessoas se isolam, param de sair de casa, e quando chegam na fase adulta precisam tentar superar seus traumas que foram causados na infância. Na adolescência, é comum que a pessoa que sofra bullying tenha insônia, pesadelos, mal estar físico, diarreia, sudorese, crises de pânico, de ansiedade, depreciações, ou seja, ela passa a se achar inferior as outras pessoas, começa a achar que é feia, pode desencadear até mesmo um distúrbio alimentar diante disso, como anorexia, bulimia. Começa a ter dificuldade em fazer amizade, não consegue se abrir com as pessoas. O primeiro sinal para saber que uma criança ou adolescente sofre bullying, é o afastamento, ela começa a se isolar, e apresenta mudanças de comportamento, começa a ficar mais quieta, triste, não quer ir à escola, não quer sair de casa”, completou Angélica .

Segundo Danila, supervisora de estágio e psicóloga da área educacional, é muito comum crianças que sofrem bullying apresentarem dores de cabeça e dores na barriga.

Abordagem dos pais

De acordo com Márcio, quando a família descobre que a criança ou adolescente está sendo vítima do problema, o diálogo é a melhor opção.

“Acho que a primeira coisa a se pensar, é que cada família tem sua característica. Respeitando essas características próprias de cada família, as coisas precisam ser conduzidas com diálogo, que é fundamental, principalmente na adolescência. Uma imposição pode ser um caminho de regressão para a vítima. E não levar em frente a queixa do adolescente, ou da criança, pode ser visto como ato de desamor, causa uma sensação de desvalia. Recomendamos o diálogo com o objetivo de evitar mais conflitos. Sabemos que os pais muitas vezes por amor, se excedem”, observou.

“Muitas vezes é necessário que a própria família busque a escola, mas ela precisa saber fazer isso. É preciso procurar a coordenação pedagógica, a direção, e evitar que a conversa ou o conflito aconteça em um momento de falta de controle. Pode ser necessária também a busca por um profissional especialista” pontuou.

Ajuda profissional

Em muitos casos, tanto a vítima do bullying quanto seu praticante, precisam de ajuda profissional. “Muitas vezes o adolescente já acha que tem um estigma social, uma marca, e quando isso acontece o caso é mais profundo, e a pessoa precisa de ajuda clínica para perceber quem ela é, além daquela marca que está em evidência. É como se o estigma social, que foi fruto de um preconceito, se tornasse parte da pessoa. Mas ela é muito mais do que aquilo, é uma pessoa com características, com personalidade e muitas vezes é preciso resgata-la para que a vida tenha sequência”, enfatizou.

Agressor

Segundo os profissionais, os agressores geralmente são pessoas que buscam o poder a qualquer custo. “Muitas vezes é uma pessoa que têm prazer em maltratar, os chamados valentões. É como se através dessa situação, eles se sentissem especiais. Mas geralmente são pessoas que têm dentro de si exatamente o oposto. São pessoas que se sentem rejeitadas e em muitas situações sentem desamor. Geralmente pessoas que praticam o bullying são pessoas violentas, porque foram violentadas internamente. A rejeição dói muito. Essas pessoas passaram por situações assim e descobrem que através do bullying se sentem superiores , e neuroticamente transformam a rejeição e a dor praticamente em uma arma”, comentou Márcio.

“Mas o agressor também precisa de cuidados, assim como quem sofre o bullying”, completou Danila.

Diagnóstico tardio

Segundo Danila, durante os estágios que ela supervisiona, é possível perceber que muitas crianças recebem um diagnóstico tardio sobre o bullying. “Percebemos que a criança está sofrendo ou praticando, só que elas são muito pequenas e não sabem o que estão fazendo. Muitas vezes elas já vem com essa carga de dificuldade de convívio da casa delas e começam os problemas. Muitas vezes a criança recebe um diagnóstico pessoal e nem é chamado de bullying. Ela passa por um tratamento, mas o tema em si, não é abordado. A criança vai crescendo e o problema vai aumentando. Ela passa a acreditar naquilo, e internaliza”, explicou.

Desde o dia 9 de março, quando os alunos iniciaram os plantões e a psicoterapia na clínica da Unip, até o dia 29 de junho, foram atendidos 118 casos em plantão e 26 em estágios de psicoterapia- dentro desses números, foram atendidos 13 casos de bullying, o que equivale a 10% de todos os atendimentos. As queixas de bullying incluem crianças, adolescentes e até adultos. 

*Com dados do site Doutor Jairo Bouer (UOL)

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