Morte de abelhas pode gerar prejuízo de R$ 60 mil, segundo apicultor Antônio Marcos
Quinta-feira, dia 3 de outubro, foi lembrado pelos apicultores o “Dia da Abelha”, data que lembra a importância desses insetos fundamentais para o equilíbrio da vida e do ecossistema. Nos últimos anos, porém, o Brasil tem sofrido a perda desses animais em grande escala por conta, principalmente, de queimadas e inseticidas.
Em Santa Catarina, por exemplo, 50 milhões de abelhas foram mortas pelo uso de agrotóxicos em janeiro deste ano. Na vizinha cidade de Casa Branca, apicultores estimam que 1,7 milhão de abelhas morreram em um incêndio ocorrido no dia 22 de setembro último.
Em três meses (de dezembro de 2018 a fevereiro de 2019), mais de 500 milhões de abelhas foram encontradas mortas por apicultores em quatro estados brasileiros, segundo levantamento da Agência Pública e Repórter Brasil.
Polinização
“As abelhas são responsáveis pelo equilíbrio no ecossistema. Para se ter uma ideia, 80% das espécies arbóreas são polinizadas por abelhas. O restante é polinizado por morcegos, vento, pássaros e até mesmo pela água, mas a maior parte são as abelhas que fazem. Elas são os animais mais importantes no processo de polinização. Sem elas, não têm sementes e corremos o risco de perder a biodiversidade floral”, diz Edilson José Guerra, professor de biologia na Feuc e PHD em biologia molecular. “É uma reação em cadeia, quando você perde os vegetais, todas as vidas que dependem deles vão ser extintas. Os predadores que dependem desses animais também morrerão. Então a extinção das abelhas traria uma catástrofe ambiental”.
Edilson explica que a polinização ocorre por apenas 5% das abelhas, já que o restante vive dentro da colmeia. “Apesar disso, esses 5% são bem representados, visto que uma colmeia é composta por mais ou menos 90 a 100 mil abelhas”, informa o biólogo.
Abelha europeia
“Temos as abelhas nativas no Brasil, que são classificadas em seis tipos. As mais comuns são Uruçu, Mandaçaia, Mandassaí, Irapuá, Jataí. Essas abelhas polinizam nossos vegetais, a nossa flora”, explica Edilson.
“Aqui no Brasil, foi introduzida em 1839 a abelha apis melífera (abelha europeia) pelo padre Antônio Carneiro. O objetivo de introduzi-la foi porque a espécie é uma excelente produtora de mel. Ao contrário do que muitos pensam, ela não poliniza, porque ela não evoluiu junto com os vegetais. Na biologia temos a coevolução, ou seja, duas espécies evoluem juntas, uma suprindo a necessidade da outra”.
“Temos os vegetais que possuem uma flor, que tem a anatomia floral, que é compatível com a anatomia corpórea dos insetos que temos aqui no país. O que significa que todos os vegetais foram evoluindo e coevoluindo com nossas abelhas nativas de modo que permitam que a polinização seja feita por elas. É uma questão de compatibilidade. A apis melífera, por ter sido introduzida, não coevoluiu com nossos vegetais. As flores que elas visitam não são polinizadas”.
“As abelhas têm o que chamamos de quimiorreceptor, ou seja, elas percebem substâncias químicas. Uma flor que já foi visitada pela abelha europeia, que não é naturalmente nossa, vai deixar de ser atrativa para as nossas abelhas. Consequentemente, elas não vão visitar essa flor, e ela não será polinizada. Esse é um problema que temos enfrentado”, completa. “Mas as abelhas europeias têm seu benefício. Produzem uma proteína chamada melitina, que é um anti-inflamatório 100 mil vezes mais potente que o cortisona. Ela é muito utilizada na apiterapia, um tratamento realizado até para a ELA- Esclerose Lateral Amiotrófica, doença que afeta o sistema nervoso de forma degenerativa”.
Produção do mel
“Quando a abelha operária vai visitar a flor, ela traz o mel no estômago, pois não tem outra forma de fazer isso. O grão de pólen ela carrega no fêmur. Quando ela chega com o mel na colmeia, uma outra abelha vai introduzir a língua na faringe dessa que trouxe o mel, obrigando-a a regurgita-lo. Com isso elas vão enchendo a colmeia. É muito importante que seja feito dessa forma, pois o estomago é caracterizado por ter um Ph ácido, o que deixa o mel com as características de acidez para evitar a proliferação de fungos e bactérias na colmeia”, conta Edilson. “O mel que fica no reservatório da colmeia também serve para nutrir as abelhas, principalmente no período do inverno”.
“Uma única abelha, consegue visitar 1.500 flores por dia, para fabricar 15 quilos de mel. Dessa forma uma abelha precisa visitar 70 milhões de flores e voar um percurso de 3 bilhões de quilômetros por ano para produzir o mel que tanto necessitamos”.
Rainha
“Dentro da colmeia encontramos a rainha, que mantém todas as abelhas reunidas, além do macho, que tem uma única função, que é a de fecundar a rainha. Tanto é que depois da fecundação ele é morto pelas operárias. A longevidade das abelhas é diferente. O tempo de vida da rainha é de cinco anos, porque ela se alimenta de um material muito nutritivo, que é a geleia real, ao passo que as operárias se alimentam apenas de mel, e vivem em torno de 35 dias”.
“A abelha rainha é a única fêmea fértil da colmeia. Apenas ela vai botar os ovinhos, que vão passar por uma metamorfose, se transformando em larvas, que podem ter dois destinos diferentes. Se ela for alimentada com geleia real, ela vai se transformar em uma rainha, ou em um zangão. Se ela for alimentada com mel, vai se transformar em uma operária. O que diferencia a operaria da rainha, é que a segunda, tem o sistema reprodutor desenvolvido. Mas geneticamente elas são iguais. Mas tudo isso é uma questão nutricional. Como ela foi alimentada com geleia real, ela desenvolve esse aparelho reprodutor”.
“A rainha produz feromônios, que é um hormônio sexual que mantém as abelhas unidas na colmeia. Sem ele, ela não conseguiria manter as outras unidas. Quando a rainha morre, a colmeia é dissipada. Porque faltou o hormônio para uni-las”.
Benefícios do mel
“O mel é um alimento muito nutritivo. Ele é excelente para fortalecer o nosso sistema imunológico. Além disso, o mel tem propriedades antibióticas e cicatrizantes. Não basta ele ter apenas um Ph ácido para evitar bactérias, ele tem que ter uma substância antibiótica também, se não, toda colmeia seria contaminada. O mel é utilizado também no alívio de sintomas de doenças respiratórias”, explica o professor.
Economia e apicultura
Antônio Marcos da Costa, empresário da “Mel Favorito” e apicultor, explicou sobre a importância das abelhas na economia, e falou sobre o trabalho da apicultura.
“A abelha gera tanto na economia formal, quanto na informal. Existem as empresas formalizadas que possuem funcionários, transporte, maquinários. Então ela gera empregos, exportação, lucros para o país e impostos. Já na economia informal, as abelhas contribuem com a renda de muitos apicultores que ainda estão na informalidade, mas que sustentam suas famílias com isso”, diz.
“Quanto a economia geral, as abelhas ajudam na produção de frutos e vegetais. Por exemplo, no caso do abacate, com a polinização das abelhas, a produção aumenta em 200%. Ou seja, o produtor da fruta vai produzir 200% a mais. No caso da laranja, é 56% a mais. Tudo isso vai contribuir com mais lucro, mais impostos, e assim por diante”.
Agrotóxicos
Segundo Marcos, os pesticidas têm contribuído negativamente com as abelhas e com os apicultores. “Hoje em dia, existem os agrotóxicos por contato. Quando a abelha tem contato com esse pesticida, ela acaba levando para a sua colmeia, e todas as outras morrem”, afirma.
A Mel Favorito mantém uma média de 100 colmeias e Marcos trabalha com abelhas desde 1986, mas começou ajudando outras pessoas. Anos depois, ele decidiu abrir a própria empresa de apicultura.
Extração
“Temos abelhas em vários sítios parceiros. Eles possuem salas de extração de mel, com equipamentos de inox. Colhemos o mel em favos e levamos para a sala de extração. Lá é centrifugado e devolvido os favos para as abelhas. Temos uma salinha de envase, onde colocamos em vidros e bisnagas, depois colocamos no comércio para vender”, destaca. “Produzimos mais ou menos 30 quilos por ano. Durante o ano todo, temos de três a quatro floradas. Mas as floradas acontecem em lugares e épocas diferentes. Então não é sempre que tem mel em todos os lugares. Depende do tempo que cada flor floresce”.
Preço e tipos
O preço do mel para as empresas que exportam fica em torno de R$ 12 o quilo. No comércio, o mel pode chegar a custar até R$ 30 o quilo, segundo o empresário.
“Na nossa região temos o mel da laranja, o cipó uva, o mel silvestre, que é feito através de várias flores diferentes, o assa-peixe, capixingui e o de eucalipto”.
Perdas
“Ao longo dos anos, já tive perdas de colmeias por agrotóxicos, queimadas e pragas. As abelhas vêm diminuindo no mundo todo, antigamente o número de abelhas era muito maior. O prejuízo é grande. Se a pessoa perder 100 colmeias, por exemplo, o prejuízo total pode chegar a R$ 60 mil. Quando o apicultor perde, geralmente é entre R$ 600, R$ 650 por colmeia. Perdemos tempo, trabalho, materiais, colmeias, abelhas e o mel”, encerra.
Por Júlia Sartori