No coração da cidade, a Di Cabeleireira completa 53 anos de seu empreendimento
Por Gilmar Ishikawa
Quem passa pela movimentada esquina das ruas Campos Sales e Dr. Costa Machado, na pressa do dia a dia, nos carros em alta velocidade, nas motos barulhentas, na caminhada do começo ou final do dia, nem se dá conta de que ali existe um estabelecimento com muitas histórias. Apesar das grades nas portas e janelas – o que é uma exigência da violência diária dessa vida moderna – o ambiente é acolhedor. No interior, decoração simples, espelho na parede, equipamentos comuns ao ofício, quadros, revistas e uma conversa que transcende o simples ato de cortar o cabelo, fazer escova, colorir as mechas. Este é o domínio de Alaíde Cândido de Oliveira. Pelo nome, assim de pronto, quase ninguém conhece, mas a Di Cabeleireira é uma personagem marcante na história dos cuidados com a beleza na cidade.
A trajetória dela chama a atenção. Nascida em Cajuru, veio com a família para São José do Rio Pardo aos 2 anos de idade. E a vida começou cedo no trabalho.
Ela tinha 10 anos de idade quando a senhora Noemia Artese, à procura de uma ajudante para seu salão, falou com a mãe da pequena Alaíde. Na época em que o trabalho infantil era, de certa forma, um caminho para a formação profissional, Di começou sua jornada. Ajudava na limpeza do salão, no atendimento da clientela e assim nem viu o passar do tempo.
“Minha mãe sempre guardava as moedas que eu ganhava e dizia que um dia aquilo serviria para eu comprar algo. De alguma forma, eu sabia que esse algo do que ela falava era uma casa”.
Por 15 anos a Alaíde foi colaboradora presente no salão de Dona Noemia, não apenas na limpeza, mas também absorvendo conhecimentos, desenvolvendo habilidades e construindo laços que se mostrariam fundamentais para o seu futuro.
Com o falecimento de Noemia Artese, Alaíde deu um passo a mais na profissão que a escolheu: abriu seu próprio salão, o Instituto de Beleza Di. O ano era 1970, registro que ela faz questão de manter na parede do estabelecimento.
Naquela época, fazer os cabelos era um luxo, glamour acessível a poucos. A Di transformou seu salão em um ponto de referência, na Rua Benjamin Constant, em um espaço alugado.
Em tempos como agora, ou seja, finais de ano, a demanda aumentava consideravelmente devido às festas de formaturas, casamentos, confraternizações. A movimentação exigia muitas mãos e, por conta disso, foram inúmeros os empregos que ela gerou. “Houve épocas de eu ter 6, 7, 8 funcionárias me ajudando”, relembra. “Muitas vezes saia do salão, às 11, 11h30 da noite. Era comum. Tinha muito serviço, graças a Deus”, continua.
Os frutos do trabalho vieram anos mais tarde. Com os recursos que juntou, adquiriu não apenas a casa própria, mas também deixou de pagar aluguel do salão, comprando um espaço próprio, agora na Campos Sales.
Aposentadoria
Com o passar dos anos, a dinâmica do mercado mudou. O número de salões pela cidade aumentou. A concorrência se tornou grande. Não seria exagero dizer que há quase que um salão em cada rua. “É natural que as pessoas aprendam e queiram montar seus próprios negócios. Aconteceu muito. As meninas trabalhavam aqui e depois abriam seus salões”.
Diante desse cenário e com mais opções no segmento, a clientela também foi mudando. “E não só por isso, mas vai diminuindo. As pessoas envelhecem, vão deixando de procurar os salões, mudam de cidade ou de salão”, argumenta. Hoje, o movimento é pequeno. Mesmo diante dos desafios, ela resiste e cultiva suas clientes, fortalecendo os laços de amizade de décadas.
“Algumas nem vem mais no salão e se tornaram mais do que clientes, são minhas amigas, minhas parceiras de excursões. Não é mais uma relação de serviço, mas de compartilhar memórias, confidências, coisas da vida”.
Há cerca de 15 anos, a Alaíde se aposentou formalmente. Apesar disso, mantém o Instituto de Beleza Di em pleno funcionamento, com a dedicação de sempre. Para ela, o espaço é mais do que apenas negócio: “É um lugar onde a gente se sente útil. Isso é a minha vida”.
Agora aposentada e com clientela só vez em quando, se dedica a viajar. Organiza excursões para diferentes regiões, em parceria com hotéis, resorts e empresas de ônibus. E toda vez tenta reunir as amigas, nas viagens da “Melhor Idade”. “É um jeito de passar o tempo, aproveitar, distrair, reencontrar as pessoas”.
A Di Cabeleireira personifica não apenas a habilidade da sua profissão como também o esforço da mulher trabalhadora, empreendedora. Ensina ainda a resiliência e a capacidade de adaptação necessárias para sobreviver às mudanças ao longo de mais de cinco décadas. Sua história é um testemunho da importância de valorizar não apenas o profissional, mas a pessoa por trás da profissão, alguém que viu a cidade se transformar ao longo do tempo, construindo sua própria história e contribuindo para a história da cidade.
É uma inspiração para todos, recordando-nos da necessidade de valorizar e honrar aqueles que, muitas vezes silenciosamente, constroem São José do Rio Pardo.