Quanto antes for iniciado o tratamento, mais chances a criança terá de ter independência e autonomia na vida adulta
No dia 2 de abril foi comemorado o Dia Mundial da Conscientização do Autismo. Só no Brasil, estima-se que haja 2 milhões de pessoas autistas e, de acordo com dados da USP, no estado de São Paulo são mais de 300 mil. O jornal Gazeta entrevistou a equipe multidisciplinar da Escola de Educação Especial Cáritas, que iniciou o trabalho com autistas em 2012 e hoje conta com 38 alunos, assim, divididos em sete salas de aula. O jornal ouviu ainda a professora Ana Rosa Rogério, mãe de Victor Manuel, um pré-adolescente autista.
Autismo
O transtorno do espectro autista (TEA) é uma condição de saúde caracterizada pela dificuldade na interação social, comunicação e comportamento. “A causa do autismo ainda é desconhecida. Estudos recentes demonstram que pode ter relação com fatores genéticos, que são os mais influentes. Geralmente de 50% a 70% estão relacionados a esse fator. Também há indícios de possíveis fatores ambientais. Alguns sinais do autismo podem ser observados por volta dos seis meses de idade. O autismo é dividido em três níveis: leve, moderado e severo. Cada criança tem uma necessidade diferente, é individualizado”, explica Thaíse Vicente Mantovani, psicóloga.
Tratamento
“Quanto antes for iniciado o tratamento, mais chances a criança terá de ter independência e autonomia na vida adulta. O tratamento deve ser feito de forma ininterrupta nos primeiros anos de vida devido a neuroplasticidade (*) do cérebro. Nossa escola utiliza atividades estruturadas nos princípios do programa TEACCH (*), que consiste no tratamento e educação para pessoas com autismo. Tivemos autistas que saíram daqui com um bom desempenho e foram para a rede regular de ensino”, relata a psicóloga.
Segundo a coordenadora Maria Carolina Maldonado Andrade, “o Cáritas oferece as mais variadas práticas de assistência aos alunos, como: atividades de apoio com a equipe, fonoaudióloga, assistente social, psicóloga e também as atividades extras: musicoterapia, equoterapia, informática, hidroterapia, biblioteca, recurso áudio visual e brinquedoteca. É sempre bom frisar que não é só a parte escolar que eles precisam, mas a família deve complementar o atendimento dado pela equipe escolar. O trabalho é feito em conjunto.”
“As atividades aqui são totalmente diferentes, para os diversos casos de autismo. As professoras fazem cursos específicos na área do autismo, realizando planejamento individualizado para cada caso”, conta a diretora Ana Luiza Magalhães de Andrade.
Márcia Jarreta Bazilli Costa, professora de Educação Física, afirma que para atender melhor os alunos, complementa o planejamento com aula de natação, hidroterapia e treino de rua, para ajudá-los a ter autonomia.
“Para os autistas obesos oferecemos esteira e bicicleta. O trabalho é feito em parceria com a nutricionista da escola para ajuda-los a controlar o peso” explica.
Inclusão
De acordo com a diretora, devido a política de inclusão dos deficientes, a rede requer ajustes para lidar com as diversas patologias. Para o processo de aprendizagem ser efetivo os atendimentos extracurriculares são necessários.
“Pelo o que temos visto, a política deve mudar, pois as escolas especiais já possuem estruturas especializadas para atende-las”, comenta ela.
Victor
Ana Rosa Rogério, mãe de Victor Manuel, com 13 anos de idade e autista, conta como foi o processo de descoberta, tratamento e evolução do filho.
“Com dois anos começamos a desconfiar que tinha um distúrbio de comportamento. Foi um momento muito difícil, até porque na época não se falava muito sobre isso, nós nem pensávamos na hipótese do autismo. Começamos investigando uma doença de visão, e encaminhado de profissional a profissional, chegamos a uma equipe multidisciplinar, que o acompanha até hoje, e que descobriu o que ele tinha. É muito difícil, muito mesmo. O começo foi bem triste, porque sabemos que o mundo não é feito para deficientes. Tudo é uma adaptação, eu me sinto como uma intérprete fluente dele em 24 horas. Eu tenho que dizer o que é o mundo para ele, e quem é ele para o mundo”, relata.
Além de Victor ter o TEA (Transtorno do Espectro Autista), ele é um DI ( Deficiente Intelectual). “Eu como mãe, precisei de terapia para conseguir entender-me primeiro, encontrar-me, o que foi muito complicado. Seguimos com as terapias e tudo foi caminhando de uma forma que eu senti a necessidade de profissionalizar-me em educação especial, para entender melhor essa problemática. Hoje eu lido muito bem com isso. Quem me conheceu antes e agora, sabe os dois lados. Apesar de ser muito difícil, há também pontos positivos. Aliamos terapias á escola, porém, é os pais que fazem a diferença. Não adianta trazermos para a escola, se a família não der continuidade em casa. É uma terapia intensiva, diária, precisa ser contínua, para obtermos resultado. As melhoras vêm a longo prazo, não de um dia pro outro”, completa Ana.
“Hoje ele encontra-se numa classificação de moderado à grave. Grave, porque ele ainda é muito dependente, pois a família que protege, impede sua independência. Aos poucos vão entendendo e deixam-no fazer as coisas sozinho. Espero que no futuro ele pelo menos se adapte e que viva da sua maneira. Sua aceitação em sociedade é o que buscamos para eles. Não vamos exigir nada que ele não possa dar. Ele não fala, mas ouve e comunica-se muito bem comigo. O que eu gostaria, como mãe, é que ele conseguisse comunicar-se com as outras pessoas também”, finaliza.
(*) TEACCH- Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Déficits Relacionados com a Comunicação
(*) Neuroplasticidade cerebral – é definida como a capacidade do sistema nervoso modificar sua estrutura e função em decorrência dos padrões de experiência