O jornal preparou uma matéria especial com depoimentos de pessoas que superaram a doença
A Gazeta do Rio Pardo preparou uma matéria especial para os leitores, com depoimentos de três pessoas que tiveram a doença, passaram por todo o tratamento necessário, e conseguiram superar o câncer.
Anderson
Anderson Rogério Melo Ferreira, 42 anos, ex-professor da ETEC Prof. Rodolpho José Del Guerra, em São José do Rio Pardo, e da ETEC Francisco Garcia, em Mococa.
“Eu descobri que estava doente por acaso. Foi em janeiro de 2015. Não gostava de ir no médico, sempre tive uma vida muito atarefada, e minha esposa que ficou falando que eu estava muito pálido, para eu ir ao médico. Resolvi ir, ele pediu uns exames, suspeitava de leucemia e me encaminhou para um especialista em hematologia em Ribeirão Preto, que foi onde eu tive a confirmação de que estava com leucemia mieloide aguda, um câncer que se propaga na medula óssea, onde é produzido o sangue, e destrói todas as células de imunidade do sangue. A médica disse que se eu demorasse mais uma semana para começar o tratamento poderia morrer. Os médicos falam abertamente da morte para o paciente, hoje em dia não tem mais enganação. Minha esposa desmaiou, não estava preparada para essa notícia”.
“Comecei o meu tratamento com quimioterapia em Jaú, na primeira quinzena de janeiro. O que mais me chocou foi a questão da morte. Eu pensei nos meus filhos primeiramente, em quantos abraços eu deixei de dar, em quantos ‘me perdoe, eu esqueci de falar’, em quantas vezes meu orgulho pesou mais alto, o que eu tinha que ter feito e não fiz. Passaram mil coisas pela minha mente. Fiquei pensando na morte mesmo, o que é uma ironia, porque a única certeza que temos na vida, é a de que vamos morrer. Foi um baque muito grande, não é fácil”.
“Eu tinha duas escolhas: ou eu me rendia à doença, ou me agarrava na fé, na vontade de viver. Eu decidi lutar. A religião me ajudou muito nesse sentido, me deu um embasamento, fé. Mas eu acredito que você não precisa ter uma religião, e sim fé na vida, vontade de viver”.
“Graças a Deus eu tenho muitos amigos, que me ajudaram muito quando precisei. A minha família também, foi a base de tudo. Meus filhos e esposa sempre me apoiaram. Se não fosse por eles e pela minha fé, não teria motivos para estar aqui hoje. Minha esperança de ver meus filhos crescerem, se formarem, me ajudou muito”.
“Vale a pena lutar pela vida. Hoje a medicina está muito avançada, fiz um tratamento experimental que veio dos Estados Unidos, fui um dos primeiros a fazer aqui no Brasil. Se fizermos a nossa parte, conseguimos bons resultados. Antigamente o câncer era considerado uma sentença de morte, mas hoje em dia com os avanços dos medicamentos, conseguimos com força de vontade superar”.
“Fiz 30 seções de quimioterapia, fiquei 60 dias internado e faço tratamento até hoje. Apesar de eu não ter resquícios da doença, os médicos consideram os pacientes curados após 10 anos. O câncer tira sua dignidade, porque te deixa extremamente dependente de outros. Para mim, a parte mais difícil é essa. Você fica revoltado com tudo e todos. Precisei tomar bolsas de sangue, tomar banho no leito, que foi dado pelas enfermeiras, minha esposa e meu filho, foi muito difícil”.
“Mas eu acho que o câncer veio para me ajudar a entender algumas coisas. Não digo que foi para me tornar uma pessoa melhor, porque ainda preciso melhorar e muito. Mas aprendi muito com essa doença. Ela mostrou que nós não somos nada. Que nossa humanidade é frágil, e que nossa vida é curta, não temos tempo para guardar mágoas ou rancor. Precisamos nos dar conta disso. Infelizmente eu vi muita gente morrer do meu lado. Tantas pessoas sentiram o que eu senti. Hoje eu vejo que eu tive a chance de abraçar um ente querido, de pedir desculpas para alguém, passar mais tempo com os filhos, chance que muitos não tiveram. Se todo mundo percebesse isso, o mundo seria diferente. A doença te deixa mais humilde. Eu agradeço o câncer, se não fosse essa passagem na minha vida, não teria amadurecido”.
“A partir do momento que você luta contra o câncer, está lutando pelas pessoas que ama também, para estar junto com elas. Eu aprendi a dar valor nas pequenas coisas, e a me colocar no lugar dos outros. Aprendi a priorizar o que realmente é importante na minha vida. E não há mal que dure para sempre. Temos que viver um dia de cada vez, a fase ruim passa, graças a Deus. É preciso estar firme, perseverante e com vontade de viver para superar”.
Mário
Mário Luis de Vitta (Marinho), 59 anos, aposentado.
“Eu descobri o câncer em 2013. Perdi meu mundo, a primeira coisa que me veio à cabeça foi que eu ia morrer. Dá uma sensação muito ruim, você se sente impotente. É uma doença assustadora”.
“Tive carcinoma escamoso na epiglote, câncer na laringe. Fui encaminhado para a Unicamp, lá me passaram o tratamento, e tinha 60% de chance de dar certo. Tive que fazer 38 seções de radioterapia e três de quimioterapia. Fiz todos os procedimentos, mas meu câncer continuou. Em 2014 fui submetido a uma cirurgia no pescoço, do lado esquerdo”.
“Com o passar do tempo, fui ver se precisaria fazer uma cirurgia do lado direito, mas o médico disse que já havia conseguido retirar todo o tumor na primeira cirurgia. Hoje ainda estou fazendo todo o acompanhamento necessário”.
“Minha família foi muito importante, minha esposa Silvia foi um dos anjos da guarda que eu tive. Até hoje ela me apoia muito. Ela me disse quando descobrimos, que íamos lutar juntos contra o câncer. Foi um apoio fundamental para mim. Ela vai em todas as consultas comigo, sou muito grato a ela”.
“A parte mais difícil foi durante o tratamento, que fiquei quase 70 dias em Campinas. Extraíram todos os meus dentes, fiquei tomando apenas líquido durante dois anos. A radioterapia é muito agressiva, ela vai causando uma queimação e desconforto, te deixa sem apetite. Fazia a cada 21 dias uma seção de quimioterapia, o que me debilitava mais ainda”.
“Quando eu descobri a doença, pesava 100 quilos, depois fiquei com 68 quilos. Umas das partes mais difíceis é o tratamento. Graças a Deus tive todo o apoio e estrutura fornecida por uma Casa de Apoio ao Câncer em Barão Geraldo. Lá fui ajudado e ajudei pessoas. Você tem as perdas, mas também os ganhos”.
‘Nunca pensei em desistir. Vi alguns desistirem, infelizmente eles faleceram, porque a doença não perdoa. Você precisa ter força de vontade. Já tive alguns amigos que desistiram do tratamento, tentei convencê-los a continuar, mas às vezes não resolvia. Até hoje estou em tratamento, é uma doença para a vida inteira. A fé e vontade de viver nunca me deixaram desistir. Minha lição sobre isso é que você nunca deve desistir de nada, e agradecer todos os dias por acordar”.
“Para todos que estão passando pelo câncer, que tenham muita fé, coragem, que não desistam e não abaixem a cabeça nunca. Podemos ter uma qualidade de vida mesmo com essa doença. Ela judia do corpo, da mente, do bolso e te domina. Mas se você tiver garra, pessoas do seu lado, você supera. Procurem todas as alternativas, e façam sempre 100% do que a medicina pedir. Não deixem nada para depois. Não perca um minuto da vida, corra atrás”.
O terceiro caso é de uma jovem do bairro Eduardo Cassucci, que começou a ter o problema aos 13 anos
Camila
Camila Carolaine Silva Costa, 18 anos, estudante e autônoma.
“Em 2014 eu estava com 13 anos de idade, faço aniversário dia 30 de dezembro. Fiquei 10 meses sem menstruar e comecei a ter problemas hormonais. Os médicos falavam que era normal pela minha idade, faziam ultrassom do útero e do ovário e não achavam nada. E eu ficava sem menstruar. Se eu não tomasse remédio, não menstruava. Tive uma alergia hormonal muito forte, e não conseguia comer alguns tipos de alimento, me deu muitas espinhas, mas eram coisas que todo mundo achava normal.
“No início de 2015 comecei a sentir dores na barriga, como eu não menstruava normalmente, só com ajuda de remédios, minha mãe achou que eu fosse voltar a menstruar e por isso estava sentindo dor. Ela me deu chá no primeiro dia, e remédio para cólica no segundo. Quando chegou no terceiro dia, vi que minha barriga estava inchada e ela me levou ao pronto socorro”.
“Estava crescendo um caroço para fora da minha barriga, do lado esquerdo. Passei por muitos médicos, até que um deles pediu para eu ir no postinho fazer um ultrassom. O exame foi pedido com urgência e demorou 20 dias para ser feito. Eu já estava com muita dor, não conseguia mais ficar o tempo todo em pé, saia do banheiro e corria para a cama para sentar e terminar de me trocar porque não conseguia mais parar em pé”.
“Antes de fazer o ultrassom continuei indo no Pronto Socorro para tomar remédio para a dor, até o dia em que o exame chegou. O médico deixou o ultrassom pronto no mesmo dia e pediu para minha mãe levar no dia seguinte para o médico, porque o meu baço, segundo ele, estava estranho. O médico disse que meu baço tinha infartado na consulta, e ele mesmo, meses antes, havia me passado remédio para verme, achando que esse era o problema”.
“Ele me encaminhou para um hematologista em Casa Branca. Como minha irmã já tinha passado por esse tipo de consulta e demorou 3 meses para chamarem ela, minha mãe não quis esperar e conseguiu um encaminhamento para o dr. Eliezer, cirurgião do aparelho digestivo. Quando ele viu minha barriga, perguntou porque ainda não haviam me internado. Fui internada no dia seguinte para fazer uma tomografia e veio um médico do Hospital das Clínicas conversar com a gente. Ele falou que eu precisava fazer uma biópsia e que em São José não fazia, que tinha dado um “negocinho”, nem para minha mãe ele contou a verdade”.
“Fui encaminhada para o Boldrini, chegamos lá e vimos algumas crianças carecas, outras chegando de cadeira de rodas, e minha mãe percebeu que estávamos em um hospital de câncer. Ligou para o meu padrasto dizendo que ia ter que me preparar para contar isso. Mas eu já tinha percebido e perguntado para ela se era, e ela confirmou. Fui brincar com as crianças até ser atendida. Eu fui a última a ser atendida. A médica foi bem clara, falou que eu estava com um tumor bem grande, e que iam refazer os exames. Se fosse confirmado novamente, eu operaria dali uma semana”.
“Realmente foi confirmado que era câncer. Eles me deram três opções: ou eu não fazia nada, ou operava e aceitava um tratamento, ou eu começava o tratamento sem operar, para ver se o tumor diminuía. Eu quis operar. Na quinta-feira, 5 de março de 2015 eu operei. O câncer estava na glândula adrenal, entre o baço e o rim. O tumor tinha 720 gramas e 14 centímetros. Depois tive o resultado da biópsia, era realmente maligno e eu comecei a quimioterapia”.
“Eu aceitei muito bem. A primeira coisa que falei pra minha mãe é que não queria ver ninguém triste, nem chorando pelos cantos. A parte mais difícil foi perder o cabelo, mas acreditei que Deus me daria forças para passar por isso. Fiquei meio anestesiada com a notícia.Internei para fazer o tratamento. Fiz oito ciclos de cinco dias, e durante os 5 dias eu tomava umas sete quimioterapias”.
“Durante o tratamento eu emagreci muito. Estava pesando 63 quilos no início, e fui pesar 50 depois. Para o meu corpo e altura, estava tudo bem até. Só que eu emagreci de uma forma que não era saudável. Eu não tinha vitamina no corpo, e comecei a desmaiar, não parava mais em pé. Fiquei 17 dias sem comer nada, só bebendo água de coco e na hora que eu tinha que tomar remédio. Eu passei muito mal durante o tratamento, comecei a vomitar sangue. Eu sentia muito enjoo”.
“Minha mãe ficou desesperada com o fato de eu estar vomitando sangue. Ela até falou para a médica que queria parar o tratamento. Como ela tinha assinado os termos para eu fazer o tratamento, se ela fizesse parar, podia até perder minha guarda. Aí decidimos continuar. Essa foi a única vez que ela pensou em desistir do meu tratamento, doeu muito pra ela ver eu vomitar daquela forma”.
“Meu pai faleceu de câncer, minha tia e avó. Não tinha muitas pessoas da família para me apoiar. Mas minha mãe, meu padrasto e meus irmãos foram muito importantes. Principalmente minha mãe que cuidou de mim a todo momento. Ela é essencial na minha vida. Sem a família eu não ia conseguir fazer nada”.
“Meu maior medo era que mentissem para mim. Eu queria saber o que realmente estava acontecendo comigo. Se eu tivesse um dia de vida, eu queria saber. A parte mais complicada foi quando eu operei e liguei para minha irmã. Falei para ela beber água, porque eu não podia, para ela comer, porque eu também não podia. Foi o único momento em que eu chorei. Eu sentia muita falta de fazer coisas simples do dia a dia, que eu não podia”.
“O que eu mais aprendi durante a doença, foi ter empatia e amor. Orar pelo próximo, de coração. Aprendi a perdoar também. Penso que se eu morrer hoje, não posso fazer isso brava com alguém. Com empatia, eu me coloco no lugar do outro, e perdoo. Com amor, não guardo rancor. Essa lição ficou para a minha vida. Hoje estou fora de tratamento, faço reposição hormonal por ter tirado a glândula adrenal esquerda, a direita não dá conta de produzir o que preciso. Mas não faço nada além disso com relação a medicação”.
Brasil tem 600 mil novos casos de câncer por ano
No dia 27 de novembro é comemorado o “Dia Nacional de Combate ao Câncer”. Além dessa data, o mundo todo promove a campanha Novembro Azul, que destaca a importância da prevenção ao câncer de próstata, doença que atinge mais de 2 milhões de homens por ano no Brasil.
Segundo uma pesquisa realizada pelo Inca ( Instituto Nacional de Câncer), a estimativa da doença no Brasil, no biênio 2018-2019, é uma ocorrência de 600 mil novos casos de câncer, para cada ano. Excluindo o câncer de pele não melanoma (cerca de 170 mil casos novos), ocorrerão 420 mil casos novos de câncer. Essas estimativas refletem o perfil de um país que possui os cânceres de próstata, pulmão, mama feminina, cólon e reto entre os mais incidentes, entretanto, ainda apresenta altas taxas para os cânceres do colo do útero, estômago e esôfago. Os cânceres de próstata (68 mil) em homens e mama (60 mil) em mulheres serão os mais frequentes. À exceção do câncer de pele não melanoma, os tipos de câncer mais incidentes em homens serão: próstata (31,7%), pulmão (8,7%), intestino (8,1%), estômago (6,3%) e cavidade oral (5,2%). Nas mulheres, os cânceres de mama (29,5%), intestino (9,4%), colo do útero (8,1%), pulmão (6,2%) e tireoide (4,0%) figurarão entre os principais.
O que é o câncer?
Câncer é o nome dado a um conjunto de mais de 100 doenças que têm em comum o crescimento desordenado de células, que invadem tecidos e órgãos. Dividindo-se rapidamente, estas células tendem a ser muito agressivas e incontroláveis, determinando a formação de tumores, que podem espalhar-se para outras regiões do corpo.
Cura
Apesar do câncer ser uma das doenças com maior taxa de mortalidade, se descoberto no início, as chances de cura chegam a 90%. É importante lembrar que mesmo pacientes que não têm cura podem viver por muitos anos com uma boa qualidade de vida, com a doença controlada e tratada, como qualquer doença crônica.
Muitos tipos de câncer podem ser curados e outros podem ter tratamentos que proporcionam uma vida relativamente normal.
Por Júlia Sartori