Anita ganhou festa de aniversário este mês, com direito a decoração, buffet e família reunida
Na alimentação, ela é regrada. Prioriza frutas, verduras e legumes, evita frituras e não toma refrigerante “de jeito nenhum”. Prefere um bom prato de arroz e feijão e não dispensa o velho cafezinho. A saúde? “Vai muito bem, obrigada!” Não precisa tomar remédios e nunca usou óculos. A pressão arterial é de uma adolescente. Está por dentro de todos os assuntos atuais, pois não dispensa a leitura de jornais. Mas quando o assunto é política, aí a conversa fica séria. “Não gosto de política, não gosto da Dilma e nem do Lula. Não me conformo com essa situação em que eles deixaram o Brasil.”
O leitor deve estar se perguntando o que há de tão especial nessas informações. Nada, não fosse a idade da entrevistada: 100 anos, completados no dia 2 de dezembro.
Com uma memória invejável, Anita é uma entre 11 filhos do casal João Vitto e Maria Beber Vitto, de tradicional família de São José do Rio Pardo. Aliás, as histórias das famílias Beber e Vitto se integram à história de 150 anos do município. “Meu pai veio da Alemanha e minha mãe da Áustria. Naquela época, o Brasil era uma terra próspera. Eles se conheceram aqui em São José do Rio Pardo e há 103 anos fixaram residência nessa casa”, conta Anita.
Ao lado das irmãs Rosa Maria, uma religiosa de 83 anos, e Carmen Vera, de 81, Anita relembra com bom humor as histórias do passado. E são muitas!
O pai João, segundo ela, era encanador e trabalhava no departamento de água da Prefeitura. “Ele fez o encanamento da cidade inteira. Naquela época, a água vinha do Rio do Peixe, no Sapecado. Quando dava qualquer problema, ele sabia direitinho onde tinha que quebrar para arrumar.”
Anita começou a trabalhar ainda criança, ajudando o pai nos afazeres. Mas logo foi contratada pela antiga Telefônica, onde se aposentou. Também a irmã Carmen trabalhou na Telefônica, além de ter trabalhado no hospital junto com Rosa Maria. “Eu acompanhei a construção da Santa Casa. Antes disso, eram as primeiras freiras chegadas da Itália que socorriam as pessoas no Educandário”, lembra a religiosa Rosa Maria.
Quando estavam na Telefônica, Anita e Carmen Vera contam que em dias de temporal os raios estouravam no ouvido delas. “Não sei como não fiquei surda!”, brinca Anita.
Lembranças
Da infância as lembranças são muitas, algumas delas bem marcantes como a Revolução de 32. “Durante a Revolução, a água da cidade inteira foi cortada e meu pai foi até o Sapecado (Divinolândia) para tentar consertar o problema. Só que ele acabou sendo preso e levado para o Rio de Janeiro, onde ficou até o fim da guerra. A mágoa que fica é que nunca houve um pedido oficial de desculpas pelo acontecido”, diz Rosa Maria.
Mas a maioria das lembranças é de momentos felizes e engraçados, muitos deles passados ali mesmo, na casa centenária da Avenida Deputado Eduardo Vicente Nasser, onde ainda residem. “A gente adorava brincar no porão da nossa casa com nossos primos da família Beber, principalmente de teatro. E o mais interessante é que aqui ficavam guardados vários caixões de zinco que eram usados para enterrar as vítimas da febre amarela. A gente brincava no escuro, em meio aos caixões, à luz de vela”, conta Anita.
A casa da família Vitto era ainda mais animada no mês de junho, durante as festas de São Pedro. “Todo ano aqui tinha terço e aquelas guloseimas deliciosas que atraiam gente da cidade inteira. No dia de São Pedro tinha baile e meu irmão Pedro Vitto montava um presépio que era a coisa mais linda”, diz Carmen Vera. Pedro, já falecido, é pai de Lúcia Vitto, diretora de Cultura.
100 anos
Anita ganhou uma linda festa de aniversário no início do mês, com direito a decoração, buffet e família reunida em sua casa. “Fiquei tão emocionada que precisei parar de falar para não chorar. A família reunida, todos comemorando aqui em casa. Espero comemorar por mais uns 50 anos ainda, porque a cada dia estou mais jovem, mais bonita e mais feliz”, brinca.
Sobre o segredo de completar 100 anos com saúde, Anita é enfática. “Hoje as pessoas vivem pelo dinheiro, maldito dinheiro! O povo tem de tudo e não é feliz porque está querendo sempre mais. Antigamente a gente não tinha nada e dava valor nas coisas mais simples, por isso era feliz.”
Por Giselle Torres Biaco – Gazeta do Rio Pardo