Gazeta Do Rio Pardo

LGPD garante proteção de dados íntimos de pessoas físicas

Advogadas explicam os riscos de fornecer documentos sem questionar o motivo

As empresas que trabalham com informações pessoais de seus usuários e clientes precisam ficar atentas. Já está valendo a LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados, que impõe uma séria de regras para a coleta, utilização, armazenamento, compartilhamento e todo tipo de tratamento de dados de pessoas físicas usuárias de serviços de empresas, sejam elas públicas ou privadas.

Para explicar sobre o assunto e alertar as pessoas sobre os riscos causados pelo vazamento de dados pessoais, as advogadas Rúbia Morgado, rio-pardense, e Karina dos Anjos, que reside em Curitiba, concederam uma entrevista durante o Jornal do Meio Dia, na segunda-feira (10). Ambas são especialistas na Lei de Proteção de Dados, e instruíram os consumidores a se proteger e buscar seus direitos de acordo com a nova legislação.

“A LGPD já está valendo. Surgiu uma confusão muito grande, porque a lei dispôs que as sanções administrativas impostas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados – ANPD apenas começariam a ocorrer a partir do dia 1º de agosto de 2021. Porém, a lei já está em vigência desde o dia 14 de agosto do ano passado. Por mais que as sanções administrativas só serão impostas a partir do dia 1º de agosto desse ano, as pessoas já podem sofrer processos judiciais, o titular de uma conta, por exemplo, já pode ir até a empresa fazer solicitações e ela é obrigada a atender e estar de acordo com a lei”, instruiu Rúbia.

Quem ela protege?

Karina explicou que pela lei, são protegidos dados pessoais de pessoas físicas. O centro de interesse da lei é o titular de dados, ou seja, as pessoas que usufruem dos serviços de determinada empresa. A LGPD protege dados como RG, CPF, endereço e todas as outras informações que identificam uma pessoa. “Essa lei também cita que alguns dados merecem um tratamento especial. Eles identificam a pessoa em um grau de intimidade muito maior, são chamados de dados sensíveis, como gênero, convicção religiosa, política. São dados que se de repente tiverem um vazamento, as pessoas podem utilizar de uma forma que gere uma repercussão muito maior para a vítima”, completou.

Importância de manter dados em sigilo

Karina dos Anjos

“Hoje em dia com muita facilidade usamos o WhatsApp para mensagens. Cabe ao titular ter uma consciência de que os dados são importantes. A partir deles, somos até mesmo influenciados. Quando seus dados são coletados você começa a ser bombardeado com várias informações”, disse Karina. Segundo as advogadas, as pessoas precisam se conscientizar, e não fornecer os dados para qualquer empresa ou estabelecimento sem questionar o motivo da informação estar sendo solicitada.

Rúbia acredita que falta educação digital para a maioria das pessoas. “Elas precisam parar e perguntar o motivo da solicitação do CPF, RG, antes de passar o documento”.

Golpes e vazamentos de dados

Rúbia Morgado

Segundo as advogadas, quando a LGPD entrou em vigor, passaram a receber mais notícias de golpes e vazamentos de dados pessoais. “Tivemos caso no Serasa, no STJ, no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, eles ficaram dias sem sistema nenhum para trabalhar. Estamos engatinhando para melhorar. As pessoas precisam ter o princípio da autodeterminação informativa. Isso significa que ela precisa saber o que será feito com seus dados antes mesmo deles serem coletados. A pessoa tem que saber com quem aquelas informações serão compartilhadas, por quanto tempo a empresa ficará com elas. Não pode ser uma coisa automática”, alertou Rúbia.

Com a nova lei, as empresas tem o dever de prestar contas tanto para a ANPD, quanto para o titular, comprovando que está de acordo com as normas da LGPD.

“Se a pessoa já tiver seus dados pessoais cadastrados em alguma empresa, ela pode pedir acesso a eles, para ver quais deles a empresa possui, e pedir para que deletem esses dados”, explicou Karina.

Os casos mais comuns que exigem a proteção de dados, estão relacionados a questão financeira, como oferta de empréstimo, financiamento, quando uma empresa desconhecida, ou que a pessoa nunca tenha contratado, entra em contato oferecendo os serviços. “Nesse caso a empresa já tem seu nome, seu telefone. De alguma forma que você não teve conhecimento e ela coletou seus dados, então você não pode exercer o direito à autodeterminação informativa, porque é uma empresa que já tem seus dados e você nem sabe quem ela é. Isso é uma coisa que com o tempo vai parar, porque a empresa não vai saber como explicar como ela conseguiu seus dados, como ela chegou até você”, esclareceu a advogada.

Rúbia explicou sobre casos em que empréstimos caem na conta dos clientes sem eles terem solicitado ao banco. “Primeiramente é importante que a pessoa não saia gastando o dinheiro, porque se ela fizer isso, terá aceitado o crédito. Nesse caso recomendamos que procure o Procon por via administrativa, ou um advogado para orientar a pessoa a entrar com uma ação judicial”.

Com a nova função do WhatsApp, de efetuar transferências e pagamentos, a chance das pessoas caírem em golpes ficou ainda maior. “Se você receber algum código pelo WhatsApp e alguém te ligar solicitando ele, não passe. Quando a pessoa tem acesso a esse código ela vai clonar o seu WhatsApp”, alertou.

Multa

Segundo as advogadas, antes da existência da lei, as empresas não se preocupavam com a proteção de dados de seus clientes. “Agora a LGPD traz uma grande persuasão que é a multa. As Leis de Proteção de Dados no mundo todo trazem essa grande multa, para que os empresários tenham consciência e adotem as medidas necessárias para proteger os dados das pessoas. Caso ocorra um vazamento por parte da empresa, ou um golpe, ela vai ter que provar que adotou todas as medidas necessárias, não apenas técnicas, mas também administrativas para que esses dados não vazassem”, mencionaram.

Além do vazamento de dados, o próprio tratamento indevido está sujeito a multas.  A LGPD também é obrigatória para os órgãos públicos. “Eles deverão se adequar. É uma tarefa que será para a vida toda, eles estão se mexendo nesse sentido”, disse Karina.

Lei de Acesso a Informação

As profissionais explicaram a diferença entre A Lei de Acesso a Informação e a Lei Geral de Proteção de Dados. A primeira dá acesso aos dados do próprio poder público. Enquanto a LGPD vai “proteger as pessoas contra esse poder público dos dados”, explicou Rúbia.

“Atualmente, o poder público, assim como qualquer empresa, não pode ter dados que não estejam justificados pela finalidade. A lei traz dez bases legais que permitem tratar essas informações. Desde um consentimento até uma proteção de crédito e um contrato. Se aquele dado que está sendo coletado ou que a empresa está recebendo porque também pode atuar como um operador, não estiver de acordo com a finalidade, ele precisa ser excluído”, completou.

 Se houver um vazamento da informação e causar algum dano, a empresa terá que repara-lo perante a lei. Karina informou que seguir a LGPD, não significa apenas criar uma política de privacidade, ou um aviso no site afirmando estar de acordo com a lei. “É preciso ter uma preparação interna para provar tanto para o consumidor quanto para um funcionário, que a empresa está de acordo com a lei. O poder público e as empresas precisam se adequar a LGPD para conversar com a Lei de Acesso a Informação. Nenhum dado poderá ser tratado ou exposto, sem estar seguindo as duas leis”, afirmou.

Divulgação de salário de servidores públicos

A Lei de Acesso a Informação exige que o salário de servidores públicos sejam divulgados no Portal da Transparência, com isso, os servidores sentem-se constrangidos. “Acredito que agora, com essa lei, haverá muita discussão em torno disso. A LGPD precisa se harmonizar com as leis que já existem. Esse aspecto terá que ser colocado na balança e vai haver uma discussão sobre o que está de acordo com a LGPD e o que não constrange o servidor público. Será que deve ficar tão exposto assim? Teremos muitas discussões a respeito. Concordo que existe muita exposição com relação aos servidores públicos, coisas até desnecessárias, então creio que haverá alguma mudança”, opinou Karina.

Como denunciar

Para denunciar o uso indevido de dados pessoais, o cliente pode inicialmente ir ao Procon, ou entrar em contato direto com o poder judiciário. As advogadas explicaram que à partir do momento que a lei entrou em vigor, as pessoas tem direito a tudo o que está especificado nela.  “As empresas precisam tratar de forma adequada os dados dos cidadãos.  Pode também ser feita uma denúncia na Autoridade Nacional de Proteção de Dados, que regulamenta todas as ações, e à partir de agosto o poder da imposição das multas já começará, e esse é o grande medo das empresas”, garantiu Karina.

“Diferente da autoridade administrativa que tem um teto para impor uma multa, a responsabilidade civil ou o próprio judiciário não obedecem a esse teto. A justiça vai impor uma multa de acordo com o dano, mensurando o que ele causou para o próprio titular”, explicou Rúbia sobre a LGPD.