Gazeta Do Rio Pardo

Oftalmologista detalha critérios para doação de órgãos

Olho com ceratocone, uma das principais causas de cirurgia ocular

Denise Fronzaglia Ferreira falou também sobre os problemas mais comuns do olho humano

Entrevistada na quarta-feira no Jornal do Meio Dia da rádio Difusora FM, a médica Denise Fronzaglia Ferreira, oftalmologista que atende em São José e em Ribeirão Preto, falou sobre a importância da conscientização sobre a doação de órgãos. Setembro é o mês em que isso é lembrado pelo Ministério da Saúde e pela Organização Mundial da Saúde. O Brasil, segundo a médica, tem hoje cerca de 35 mil pessoas aguardando algum tipo de transplante para continuarem vivas ou para terem uma melhor condição física.

Denise começou falando que a principal causa de cegueira reversível em seres humanos é o grau, seguido de glaucoma (degeneração do nervo ótico) e catarata (perda de transparência do cristalino). “O grau é bem ‘democrático’, desde o bebezinho até alguém que nunca usou óculos nos primeiros 40 anos pode apresentar esse problema de visão. A catarata, porém, tem relação com a idade, afetando as pessoas mais velhas, enquanto o glaucoma aumenta de incidência após os 40 anos, sendo bem prevalente depois, embora também possa ocorrer antes”, explicou.

Outro problema visual, o ceratocone (enfermidade não inflamatória que afeta a estrutura e o formato da córnea), pode acontecer na adolescência ou na fase adulta jovem também, segundo a médica. Ela diz que essa é a doença da córnea que, como oftalmologista, mais efetua cirurgias.

Olho claro e olho escuro

Denise conta que pessoas com olho mais claro têm mais tendência a apresentar um outro tipo de problema: a degeneração macular decorrente da idade. Quando associada a tabagismo, obesidade e outros fatores, tais pessoas necessitarão de procedimentos médicos específicos para não perderem a visão.

Por outro lado, ainda de acordo com a médica, quem tem olho muito escuro tem mais tendência a apresentar glaucoma por conta da pigmentação, que pode sofrer alterações fisiológicas.

Não é mais lei

Falando da legislação acerca da doação de órgãos, a médica lembrou que até 2001 existia uma lei, criada em 1997, que exigia que as pessoas colocassem no RG ou na CNH de eram ou não doadoras. “A partir de 2001, basta você expressar o seu desejo para algum familiar seu. É ele quem irá falar por você quando você estiver para deixar este mundo. Aí o médico irá contatar a família para que ela confirme tal intenção”, afirmou.

Denise diz que o doador pode doar desde órgãos vitais, como coração, pulmão, rim, pâncreas ou intestino, até tecidos e ossos. Córnea é considerada um tecido, podendo assim ser doada até por pessoas mais velhas, desde que esse órgão esteja em bom estado. A médica observa que os profissionais médicos fazem sempre uma análise caso a caso, antes de qualquer decisão.

Preconceito e receio

A oftalmologista ressalva, no entanto, que ainda há muito preconceito quanto a doação e até mesmo um receio, que ela denominou de “lenda”: de que alguns eventuais doadores não recebam bom atendimento médico porque o interesse de certos profissionais da área é nos órgãos deles. Seria o tráfico de órgãos, que, vez ou outra, faz parte do noticiário policial.

“Claro que já existiu uma série de irregularidades que se ouve falar, até porque há gente ruim em todos os lugares. Eu, porém, pessoalmente, nunca presenciei isso, até porque a doação nem é registrada mais nos documentos da pessoa e os profissionais da saúde farão todos os esforços necessários para salvar aquele paciente. Familiares dele é que expressarão a possibilidade de doação após o falecimento dele”, diz.

Transplante de córnea


Dra. Denise Fronzaglia Ferreira no estúdio da Difusora FM

O transplante de córnea, segundo ela, sempre é recomendado na fase não urgente, eletiva, mas também é feito, obviamente, após traumas ou acidentes oculares. “A córnea é um tecido interessante porque você pode trocá-la inteira, ou só a parte da frente ou então só a parte de trás. Quando é inteira é algo mais demorado porque tem muitos pontos e a qualidade visual fica comprometida quando os pontos ficam na córnea. A gente vai tirando e vai melhorando, mas demora de seis meses a um ano. Se o transplante for apenas de uma parte dela, então a recuperação vai de quatro a seis meses”.

Morte encefálica

A morte encefálica (do cérebro e do tronco cerebral, considerados o centro de comando do corpo) é considerada pela medicina a condição que permite ao paciente doar todos os órgãos, inclusive tecidos, desde que a condição cardiovascular esteja preservada. Outros dois tipos de doadores são os que tiveram morte por parada cardiorrespiratória, que só podem doar alguns órgãos, e os vivos, que podem doar um rim, uma parte do pulmão ou do fígado e ainda a medula óssea. Em todos os casos, porém, a questão da compatibilidade é crucial.

“Sempre que tem vaso sanguíneo envolvido, e também alguns outros marcadores que a gente leva em consideração, a compatibilidade também estará envolvida. Os únicos transplantes que não envolvem esses fatores são alguns tipos de tecidos, como a córnea, que serve para qualquer tipo de pessoa”, assegurou.

Riscos

Quanto aos riscos para os doadores vivos, especialmente quando doam órgãos como o rim, Denise comenta que o primeiro perigo é a cirurgia em si, por envolver cortes, vasos sanguíneos, possibilidade de infecção hospitalar etc. Mas, segundo ela, esses riscos são bastante reduzidos atualmente pela qualidade dos centros cirúrgicos que efetuam os transplantes. E, após a doação, o doador poderá necessitar de mudanças em seus hábitos de vida, não podendo abusar de algumas coisas que antes lhe eram bastante comuns.

Quem não pode doar

A médica disse que usuários de drogas não podem ser doadores. Ela explica que, neste caso, os riscos para o receptor são grandes, podendo até adquirir doenças transmitidas pelo sangue do doador, como HIV ou outras.

Quem pode

A medicina aceita transplante de doadores vivos até o quarto grau de parentesco ou do cônjuge. “Fora isso, a gente precisa de liberação judicial, como de um amigo que queira doar, desde que se verifique a compatibilidade. E uma opção interessante para quem queira doar medula óssea é que existe o Banco de Cadastro de Doares de Medula Óssea. Isso está no google, onde é possível ver os critérios como testes sanguíneos e outros detalhes. Quando aparecer um paciente necessitado, o sistema chamará o doador”.

Doação de sangue

No final da entrevista, feita por Luis Fernando Benedito, Denise pediu aos ouvintes que considerem a possibilidade de doar sangue. Isso porque, segundo lembrou, a doação de sangue, tão vital em todo o mundo, vem caindo muito nos últimos anos, mesmo sendo a mais simples das doações de órgãos e uma das mais necessárias à sobrevivência dos seres humanos.