Gazeta Do Rio Pardo

Variante Delta apresenta aumento de 54% de internações, diz infectologista

Marcelo Galotti, infectologista

Comportamento das pessoas no inverno pode favorecer contágio

Neste domingo (4), o Brasil registrou 18.769.808 casos confirmados de Covid-19. O número de mortes em decorrência da doença já ultrapassou 524 mil. Entretanto, mais de 17.082.876 milhões de pessoas já se recuperaram. Segundo especialistas, o Brasil enfrenta estabilidade nos números relacionados a Covid, com tendência de queda nas próximas semanas. O infectologista Marcelo Galotti, concedeu uma entrevista na quarta-feira(30), e comentou sobre a situação do país com relação a pandemia, vacinação, e explicou as características da variante Delta, que tem preocupado as autoridades do mundo todo.

Mesmo com estabilidade, situação ainda é preocupante

“Temos dados altos, com uma tendência de diminuir. Mas são notadamente altos. Se fizermos uma avaliação da situação geral que temos feito, melhorou. Antigamente percebíamos aumento nos estados e níveis crescentes. Hoje está decrescente e os estados estão com números estabilizados. Quando comparamos maio com junho, a diferença não é muito grande, mas em junho deu uma melhorada. Se analisarmos a posição do Brasil no ranking de mortes, em número absoluto, o país está em 2º lugar, só perde para os EUA. Entretanto, há uma média de 2 mil ao dia, e os EUA que tinha 4.500 caiu para 400. Em 60 dias o Brasil passou os Estados Unidos e passou a ser o topo desse ranking. A situação brasileira é muito triste, é preocupante”, declarou.

Mundo

Marcelo destacou que a América Latina tem 8% da população mundial, com 25% das mortes por Covid, número considerado altíssimo. “A situação está mal no Brasil e na América Latina como um todo. A Ásia tem a Índia que é um problema, mas tem Israel que já voltou praticamente a situação normal, anterior a pandemia. Na Coréia do Sul, quando os casos na China estouraram, a epidemia passou para a Coréia do Sul, que hoje, é um país exemplo no controle da Covid. A Europa vive um momento muito bom”, declarou.

Vacinas

O infectologista definiu a vacinação no Brasil como ‘problemática’. Até sexta-feira, apenas 12% da população foi vacinada com as duas doses. O médico comentou sobre a Janssen, recém chegada no país.  “É uma vacina americana, e tem a grande vantagem de ser dose única. Ela é uma excelente arma para idosos acamados e moradores de rua, porque dificilmente eles retornariam para tomar a segunda dose. O Brasil está tentando articular algumas compras, mas teve por enquanto a doação dos EUA. A segunda vacina a ser observada é a Pfizer que vem com 100 milhões de doses. Ela tem uma proteção geral muito grande, é extremamente importante. Assim como a AstraZeneca, na 1ª dose ela já tem uma proteção de mais de 50%, diferente da CoronaVac, que na primeira dose tem 13% de proteção”, comparou.

Para Marcelo, a melhor vacina é a aprovada pela a Anvisa, que é o caso de todas que já são utilizadas no país. “A vacina excelente é aquela que está no braço. É importante que a população entenda que todas as vacinas são boas, e a preocupação deve ser a respeito da coletividade. Essa situação de esperar a melhor vacina, de querer escolher ou mudar a segunda dose, acaba perdendo todos os referenciais. As duas doses da AstraZeneca oferecem uma proteção de 84%, o que é excelente, mas se a pessoa tomar a 1ª dosa da CoronaVac e a 2ª da AstraZeneca, não temos estudos nesse sentido. Não devemos tratar as vacinas como se estivéssemos em um restaurante”, orientou.

Variante Delta

Já se sabe que a variante indiana, nomeada Delta, é até 60% mais transmissível do que a variante Alpha (Reino Unido) e que provoca doença com mais sintomas, sendo também mais resistente às vacinas. O infectologista comentou e explicou as características da nova variante.

“As grandes autoridades do mundo fazem uma previsão preocupante. Ela será provavelmente o agente etiológico dominante. Ela surgiu na Índia em outubro, coincidentemente no fim da primeira onda, que foi uma onda tranquila, que deixou o país com guarda baixa, aí fizeram as artes habituais: liberaram comício para campanha política do governador do estado, liberaram uma grande festa religiosa, jogo de cricket com 120 mil espectadores e deu no que deu. A Índia chegou em uma situação de jogar corpo no rio. Por trás desse descuido, tinha a variante Delta. Ela já está em 90 países, inclusive no Brasil e no coração da Europa, que é o Reino Unido”, informou.

Marcelo mencionou as características que são levadas em conta na avaliação de uma variante.

– Transmissibilidade: comum em todas as variantes, são mais transmissíveis que o Sars- CoV-2;

– Patogenicidade: Nenhuma variante até então, tinha manifestado ações de maior patogenicidade. A Delta responde a essa possibilidade.

– Não resposta a medicamento: “Não temos medicamento para o Sars- CoV-2, então isso não é avaliado”, declarou.

– Escape a vacina: “Nenhuma variante escapava à vacina. A variante Delta tem um quadro clínico traiçoeiro. Ela entra como um resfriadinho comum. No início, no período prodrômico* isso estica. A época que o indivíduo mais transmite o vírus, é quando ele é sintomático. A Delta dura mais dias do que as outras variantes como se fosse um resfriado comum”.

De acordo com o médico, outro problema que chama a atenção, é que a Delta não apresenta perda de olfato e paladar, como o vírus em sua forma inicial. Com isso, ela fica mais tempo transmitindo, sendo muitas vezes confundida com um mero resfriado. “Essa alteração é extremamente perigosa. Além disso ela tem uma tração, a espícula dela, que é o que injeta no receptor a célula parasitada, quando ela entra no corpo, rapidamente é injetada, o que dificulta o sistema imunológico a criar anticorpos, e acaba deixando a situação mais agravada”, relatou.

Marcelo revelou que a variante Delta apresenta 54% mais internações do que as outras. “A Pfizer apresenta perda de 15% a 20% de potência contra ela, assim como a AstraZeneca. Apenas a primeira dose dessas duas vacinas perde o efeito contra a Delta, isso é um grande problema”, disse preocupado.

Covaxin

A Anvisa suspendeu no dia 30 de junho, o prazo para concluir a análise do pedido de uso emergencial da vacina Covaxin, desenvolvida pelo laboratório indiano Bharat e Biotech, cujo contrato de compra é alvo de suspeitas de irregularidades. Marcelo comentou sobre a eficácia da vacina.

“A Covaxin é uma vacina produzida na Índia com vírus inativado, semelhante a CoronaVac. Ela tem uma proteção geral muito boa, cerca de 80%. É fabricada por uma empresa muito respeitada em parceria com o Instituto de Virologia Indiano, tem tudo para ser uma boa vacina. Entretanto é uma vacina que encareceu, porque a Índia tentou subsidiar o uso gratuito dela no país, repassando o custo para exportação. A Covaxin foi reprovada pela Anvisa. Ela tem alguns problemas, e falhas técnicas segundo a Agência. Embora seja uma vacina boa, foi reprovada”, completou.

Estudo em Botucatu

O estudo feito pela Unesp, em parceria com o Ministério da Saúde e a Prefeitura de Botucatu (SP), com a vacina AstraZeneca, a segunda mais usada no país contra a Covid, mostrou redução de 71% de casos da doença seis semanas após a vacinação em massa na cidade paulista.

“A AstraZeneca, que tem o intervalo de dois a três meses entre a primeira e segunda dose, garantiu apenas com a primeira dose, a diminuição em 71% da aparição de novos casos na cidade. Com esse resultado, automaticamente são menos internações, menos mortes, menos consumo de medicamentos, preserva-se recursos humanos. A resposta foi muito boa”, disse.

Inverno

O médico falou sobre a relação do inverno com o vírus, e constatou que o comportamento da população nessa época do ano, favorece o contágio.  “No inverno, ventila-se menos, o vírus adora lugares que não ventilam. No frio as pessoas se aglomeram, tem proximidade. Não é o frio ou o calor que influenciam na doença, mas é o comportamento das pessoas que facilita a transmissão”.

Pfizer e RNA

Nos últimos dias, muitas fake news foram espalhadas a respeito de uma suposta alteração no código genético de pessoas que receberam a vacina da Pfizer. O infectologista desmentiu a informação. “Como a vacina da Pfizer foi feita com base em RNA que faz parte do código genético, foi levantada a possibilidade de que ela alterava a genética das pessoas, que nasceriam filhos com defeitos. O RNA nem entra no núcleo da célula, quem está nesse núcleo é o DNA, ele que é o grande comandante. Tem zero de interferência no código genético das pessoas”, encerrou.

*Prodrômico– Relacionado aos pródromos, ao conjunto de sintomas que antecede a manifestação ou o aparecimento de uma doença.