Gazeta Do Rio Pardo

Fim de projeto social atrapalhou formação de ginastas

Rodrigo Ramos e o ginasta Arthur Zanetti ( Reprodução: Arquivo pessoal)

Para alcançar alto nível, atletas olímpicos treinam até 8 horas por dia durante a semana toda

Os jogos Olímpicos de Tóquio chegaram ao fim. Com o evento de encerramento realizado no domingo (8), a ginasta Rebeca Andrade, que conquistou uma medalha de ouro na final do salto, e prata na disputa pelo individual geral, participou do último evento, como porta-bandeira do Brasil. O país já teve e ainda tem grandes nomes na ginástica artística, como Daiane dos Santos, Jade Barbosa, Laís Souza, Danielle e Diego Hypólito, Arthur Zanetti, Arthur Nory, entre outros destaques. São José do Rio Pardo já teve ginastas mirins com grande capacidade e talento. A Casa de Cultura e Cidadania, projeto encerrado no ano de 2018, acolheu e desenvolveu o interesse de muitas crianças rio-pardenses pela ginástica artística.

A Gazeta do Rio Pardo, em conjunto com a Rádio Difusora, entrevistou Rodrigo Ramos, professor de educação física com especialização em ginástica artística, que foi coordenador da modalidade no projeto, e atualmente dá aulas como professor voluntário no DEC. 

Rodrigo falou sobre como os grandes nomes da ginástica podem servir de inspiração para as crianças nos dias atuais. “A Rebeca, nossa atual campeã, é fã da Daiane dos Santos. Quando ela era criança ela assistia as apresentações da Daiane, e se inspirou nela. Dessa forma ela entrou para a ginástica, manteve o sonho e está aí hoje. Conseguimos ter resultados palpáveis com esses nomes. Com a mídia para o esporte, as crianças tendem a se interessar. Em um mundo onde as crianças preferem ficar em casa no celular ou no computador, um resultado como o da Rebeca faz com que elas tenham vontade de ir para o ginásio e fazer uma atividade física que é algo muito bom para o desenvolvimento. Esses atletas são responsáveis pela procura dessas crianças ao esporte”, comentou.

Casa de Cultura e Cidadania

Durante dez anos, de 2008 a 2018, crianças e adolescentes de São José do Rio Pardo puderam conhecer e participar do projeto social patrocinado pela AES Tietê, Casa de Cultura e Cidadania. A instituição oferecia aulas culturais, artísticas e esportivas de diversas modalidades. Rodrigo trabalhou como coordenador de ginástica artística do projeto, e falou sobre a importância que ele teve para o município. “Passaram milhares de crianças e adolescentes por ela durante esses dez anos, cerca de 5 mil crianças. Tinha um investimento bem alto. Durante esses anos de realização, ajudamos muito no quesito social, onde as crianças começaram a fazer atividades físicas e culturais. Infelizmente o aporte do patrocinador começou a diminuir, até que parou. Projetos assim são sustentados pela iniciativa privada, e se diminui, as coisas vão se desestruturando até terminar”, disse.

“A Casa de Cultura e Cidadania conseguiu fazer com que as crianças preferissem estar ali do que estar na ociosidade. No projeto tínhamos uma estrutura muito boa de roupas, lanches, equipamentos, infraestrutura das salas, materiais de boa qualidade. Foi algo brilhante e maravilhoso que a cidade teve oportunidade de ter. Com o término do projeto ficou uma lacuna muito grande para os jovens de hoje em dia e até mesmo para os que participaram dele. Não culpo a Prefeitura por não ter conseguido mantê-lo, pois o valor investido pela empresa era altíssimo. Acho muito difícil alguma empresa investir um valor tão alto para trazer um projeto como esse, como a AES Tietê fez”, completou.

A CCC tinha o mesmo patrocinador de grandes clubes, como o Pinheiros, por exemplo. Alguns alunos do projeto tiveram a oportunidade de conhecer atletas profissionais da ginástica. “Por ser o mesmo (patrocinador), fazíamos muitos intercâmbios, eles vinham para cá, nós para lá, e as crianças treinavam junto com os atletas profissionais. Na época, Arthur Nory, Diego Hypólito, Daiane dos Santos e a Laís, treinavam nesse clube. Alguns alunos da Casa de Cultura, principalmente da ginástica masculina, onde tivemos melhores resultados, já estavam sendo sondados pelos profissionais. Creio que se tivesse continuado o projeto com a evolução desses alunos, poderíamos ter tido um aluno competindo em Olímpiadas”, declarou.

“Convivi com esses atletas renomados, e ao conversar com eles, percebi que são pessoas simples, que vieram do nada. Graças ao que eles estão vivendo hoje, conseguem fazer um pé de meia, pois nesse nível em que estão, atraem muitos patrocinadores. São pessoas que merecem tudo o que está acontecendo”, disse.

Alunos talentosos

De acordo com o professor, alguns dos alunos da antiga Casa de Cultura e Cidadania praticam a modalidade até hoje. “Um deles se destacou, ele está trabalhando no Cirque du Soleil, o Vinícius Vasconcelos. Ele é um dos meninos que podemos apontar porque continuou e conseguiu brilhar em um nível de excelência, tanto que está hoje no melhor circo do mundo”, elogiou.


Ex-alunos de Rodrigo com as ginastas Daiane dos Santos e Laís Souza

Conformeobservou Rodrigo Ramos, a ginástica artística requer um investimento financeiro elevado por parte dos Centros de Treinamento. “É um esporte difícil de ser praticado. É caro, precisa de um investimento alto”, contou.

Ele destacou ainda que a idade indicada para uma criança começar a praticar ginástica artística, é a partir dos 4 anos. “Nesse caso, é uma classe baby, tem que ter um professor especializado nessa idade. Caso não tenha essa classe nas cidades e academias, o indicado é a partir dos sete anos”, disse Rodrigo.

Treinamento

Um atleta de nível olímpico da modalidade, treina 8 horas por dia durante toda a semana. “São treinamentos repetitivos, incansáveis, e muita fisioterapia. É um esporte que ocasiona muitas micro lesões, que são recuperadas rápido, mas os atletas precisam ficar muito tempo no ginásio e na fisioterapia”, explicou.

Segundo ele, para praticar a ginástica artística de forma amadora, não existe um padrão físico, mas para um nível competitivo, a própria seleção natural faz com que os mais baixos se destaquem.

O profissional aproveitou para desmistificar sobre prejuízos que a prática da ginástica traria ao crescimento das crianças. “É mito. A explicação é simples, os mais baixos tem um centro de gravidade mais próximo ao chão, são mais rápidos, mais habilidosos e velozes para a prática da ginástica. Naturalmente os mais baixinhos são os melhores atletas para a modalidade”, concluiu.

Pandemia e aulas no DEC

“A pandemia atrapalhou muito os esportes em geral. Esses quase dois anos em que essa geração ficou afastada, foi de muita perda. Não sei o que será feito para tentarmos retomar o ritmo. Aqui em São José do Rio Pardo tínhamos uma equipe feminina do DEC formada, com crianças em transição para a adolescência. Esses dois anos que elas ficaram fora, ganharam peso, tiveram mudanças corporais, e até mesmo a parte psicológica entra em questão, acabam desanimando por ficar longe. Sinto que vai demorar para recuperar, e alguns atletas até já se perderam pela falta dos exercícios”, disse.

Segundo Rodrigo, as aulas no DEC estão retornando com 30% da capacidade, para seguir o protocolo sanitário. “Estamos voltando com poucas crianças.  Agora estamos treinando a equipe que já havíamos formado para tentar voltar ao preparo físico que as meninas tinham antes, e temos que trabalhar a parte técnica. Se tudo der certo, até o fim do ano retomaremos com as competições”, declarou.

“Tenho 40 alunos hoje, temos uma sala grande, dá para seguir o distanciamento, mas ainda não conseguimos colocar os 100% na sala. Tenho alunos de 6 anos, até os 22”, comentou.

As aulas no DEC ocorrem três vezes por semana, de segunda, quarta e sexta-feira das 18h00 às 19h30. As crianças interessadas devem deixar o nome na secretaria do DEC para entrar na fila de espera, e assim que novas vagas forem abertas, serão avisadas.