Gazeta Do Rio Pardo

Ex-prefeito morreu na clínica clandestina

Ruy Ferreira de Souza, ex-prefeito de Anhembi faleceu na clínica

Internado para tratamento, Ruy Ferreira morreu no ano passado mas o caso ainda não foi esclarecido

Deveria ser uma clínica para recuperação de dependentes químicos. Instalada em uma chácara na região do bairro Santa Luzia, a “Renascer Para a Vida” recebia pessoas de várias cidades do interior e até de outros Estados. Cada família pagava em média 1 salário mínimo para que os seus entes fossem devidamente cuidados e tratados. Mas investigações do Ministério Público apontaram que a instituição não era o que aparentava.

Os problemas começaram com a falta de estrutura para abrigar os internos. A chácara foi adaptada mas faltava a documentação dos órgãos de saúde.

Havia denúncias de maus tratos, acomodações insuficientes, cárcere privado, emprego de medicamentos sem orientação médica. A clínica foi visitada pela autoridade titular da 1º Promotoria de Justiça de São José do Rio Pardo, Dra. Júlia Alves Camargo Butzer. Na ocasião, ela conversou com internos, vistoriou as instalações, falou com os responsáveis e deu prazo para que fossem feitas adequações visando melhor acomodação dos internos. Encerrado o prazo, e havendo constatação de que os procedimentos não avançaram, no final do ano a Promotora determinou o fechamento do local.

No dia 19 de novembro do ano passado, uma equipe multitarefa com policiais militares, guardas municipais, agentes de fiscalização da Vigilância Sanitária, técnicos da Assistência Social e da Saúde Mental estiveram na clínica, para fechamento do espaço, sob protestos do responsável, que dizia estar providenciando as exigências. Mas a ordem era fechar e assim foi feito.

Por conta da medida, os mais de 40 internos foram encaminhados às suas respectivas famílias. E o imóvel permaneceu lacrado até poucos dias.

Mas, nas últimas semanas, o responsável reabriu a clínica. E lá já estava abrigando 4 internos. Um deles, porém, denunciou ter sofrido maus tratos. Ele apresentava escoriações diversas, em várias partes do corpo.

A denúncia foi apurada e, na última quarta-feira, 10, uma operação coordenada pelo Ministério Público, com participação da promotora, polícias Civil e Militar, agentes da Vigilância Sanitária, Saúde Mental e Assistência Social resultou em novo fechamento da clínica. Desta vez, com a prisão do proprietário e mais dois auxiliares, que estão sendo acusados de cárcere privado, tortura e tráfico de entorpecentes.

Clínica já havia sido fechada uma vez em 2020

Morte na clínica

A notícia sobre o novo fechamento da clínica e a prisão de seus responsáveis ganhou as manchetes da imprensa e repercutiu longe. Na manhã de quinta-feira, uma pessoa procurou a reportagem de Gazeta do Rio Pardo para falar sobre o assunto. Em especial, do ocorrido no dia 13 de novembro do ano passado, quando um homem, de 63 anos de idade, foi encontrado morto no local.

No boletim de ocorrência da época, o caso está como suicídio. Segundo consta, na hora do almoço, um funcionário da clínica serviu a alimentação ao idoso, no quarto em que ele estava. Pouco depois, diz o documento, quando o funcionário voltou para recolher o prato, o idoso estava sem vida. Teria se enforcado usando amarras feitas de fronhas.

O homem era Ruy Ferreira de Souza. Tudo o que se sabia sobre ele, até então, é que fora internado compulsoriamente por uma das filhas para tratamento de dependência química. Outros familiares, porém, não compreenderam porque ele veio parar em São José do Rio Pardo, uma vez que, dizem, não se enquadrava no perfil de drogadito.

A investigação sobre a morte continua mas familiares contestam a versão de suicídio. Em um bilhete ao qual tivemos acesso, Ruy manda um recado à filha dizendo que estava sofrendo e pedia para que o retirassem da clínica.

Ruy era pessoa conhecida e bem quista na cidade de Anhembi – um pequeno município de aproximadamente 7 mil habitantes, na região de Botucatu – onde ele foi prefeito por dois mandatos, de 2004 a 2012. Em 2013, ele foi esfaqueado ao escapar de uma tentativa de assalto. Em 2016, disputou novamente, mas teve a candidatura indeferida. Na eleição passada, uma filha foi candidata a prefeita e terminou na terceira colocação. Ruy faleceu dois dias antes do pleito.

As investigações quanto à morte do ex-paciente permanecem paralelamente à apuração sobre as atividades da clínica. Ainda inconformados, os familiares aguardam um desfecho que possa elucidar o ocorrido.

Por Gilmar Ishikawa