Gazeta Do Rio Pardo

Ele é carteiro, psicólogo e graduado em história

“O carteiro tem uma posição privilegiada para observar o comportamento das pessoas”, diz Elias

Elias Carmo Rolemberg, rio-pardense, 58 anos, é carteiro, psicólogo e graduado em história. Ele atua no correio há 15 anos e se formou em psicologia no ano de 2018. Elias mantém as duas profissões, e consequentemente, dois empregos. Durante o dia faz o trabalho de carteiro e, à noite, atende em seu consultório como psicólogo.

O carteiro-psicólogo conta como foi o processo de descoberta da nova profissão, e fala sobre as experiências que ganhou durante todos esses anos no correio.

“Fazer o curso de psicologia não foi uma decisão imediata. Primeiro, fiz faculdade de História e, quando conclui, fui habilitado para ser professor. Mas aí eu teria que sair da cidade, tentar em outros lugares, e não quis. Apesar disso, o curso de História me deu uma noção de que eu gostava das relações humanas. Meu próprio trabalho no correio fazia isso. Eu observava situações e circunstâncias. O carteiro costuma ser invisível, quando você chega em um ambiente, faz parte da paisagem. As pessoas não te conhecem por quem você é, e sim por carteiro. Você toca a campainha, alguém olha e fala: Achei que tinha gente, é o carteiro. Ou o adulto pergunta pra criança quem é, e ela responde: Não é ninguém, é o carteiro. Por esse motivo, ele tem uma posição privilegiada para observar o comportamento das pessoas. Eu me peguei fazendo isso, observando, avaliando, compreendendo, vendo o lado das pessoas. Depois que terminei História, aprendi que não existe verdade absoluta, e que sempre há uma outra versão. Isso me ajudou bastante a me identificar nessa parte do ‘observar’”, conta Elias.

Fies ajudou

Segundo ele, quando descobriu sobre o Fies, teve a oportunidade de se matricular no curso de Psicologia. “A gente nunca sabe o que é a psicologia em si. Mas com o passar dos cinco anos de curso, comecei a aprender e perceber que aquilo era o que eu gostava realmente, é uma coisa que me realiza. Poder auxiliar as pessoas para conseguirem resolver os seus problemas. Um psicólogo não diz o que é certo ou errado, ele apenas situa a pessoa, mostra que ela não está só. Traz as responsabilidades a ela. É uma profissão muito prazerosa. São vários campos na psicologia, na faculdade você aprende as técnicas, mas não existe só um tipo de psicólogo”, prossegue.

Para Elias, as experiências e a maturidade são diferenciais para exercer bem uma profissão. “Aprender com os erros, as decepções, tudo isso vai fazer com que você aperfeiçoe sua profissão. Eu sempre tive um olho clínico por causa da minha experiência no trabalho como carteiro, sempre lidei com o público, mas extraía só o que me interessava. Hoje eu entendo que eu preciso extrair o que interessa para a outra pessoa, não para mim. Apesar de ser recém formado, me sinto à vontade para atender uma pessoa. Estou atendendo seis pacientes fixos, e tenho alguns que vou a domicilio. Ao todo, tenho uns 11 pacientes”, afirma.

Aposentadoria

“Eu ainda tenho mais uns três ou quatro anos de correio até me aposentar. Mas a minha ideia é me dedicar mesmo a psicologia, aumentar o número de pacientes. O serviço de carteiro é um trabalho duro, físico. Eu já estou com 58 anos de idade, então não tenho mais tanta resistência. Eu gosto de ser carteiro, foi ali que me encontrei, que eu vi o que é ser ‘gente’. É um trabalho digno, e há um preconceito muito grande contra trabalhos braçais na sociedade. A maioria das pessoas acha que é uma profissão desqualificada, que o carteiro não conseguiu nada na vida e entrou pra essa profissão. Assim é a visão com coletor de lixo, pedreiro, servente de pedreiro. Ao longo da história, o trabalho braçal sempre foi mal visto, desde que começou a Idade Média. Tinha o clero, os burgueses e por último, o agricultor, que era visto como ninguém. O serviço de carteiro naquela época, eram os escravos que faziam”, conta.

“O trabalho é algo que valoriza o ser humano. Tenho orgulho de ser carteiro. Os meus colegas de trabalho têm formação em outras áreas. Lá tem professor, administrador, e alguns estão para se formar. Se eu pudesse continuaria exercendo as duas profissões, sempre foi uma grande fonte de conhecimento para mim, mas devido a questão da idade, a tendência é eu me aprofundar mais na questão da psicologia. Pretendo fazer alguma especialização daqui um tempo”, encerra Elias.

Contato

Para mais informações ou agendamento de consultas, ligue para o número (19) 99387-6114. O consultório fica localizado na Praça Oliveiros Pinheiro, 161 (praça do Epidauro).

Elias Carmo Rolemberg continua no trabalho de carteiro, mas já atua como psicólogo

 

Por Júlia Sartori