Gazeta Do Rio Pardo

Cresce número de crianças envolvidas em tráfico e uso de drogas na cidade

Mariana Machado Maia e Priscila Raquel Bombonatto Capiteli

Segundo conselheira, há casos de crianças de 11 anos vendendo entorpecentes

Dia 18 de novembro, foi comemorado o ‘Dia Nacional do Conselheiro Tutelar’. Priscila Raquel Bombonatto Capiteli, atual coordenadora do órgão no município e Mariana Machado Maia, 1ª secretária, foram entrevistadas na rádio Difusora, por Reginaldo Capitelli, na quarta-feira(18). As conselheiras falaram sobre como ingressaram na instituição, relataram os maiores desafios, e citaram os casos de denúncias mais recorrentes na cidade.  Além disso, comentaram sobre como o Conselho Tutelar tem realizado atendimento durante a pandemia.

Priscila começou contando sobre como entrou para o Conselho Tutelar.

“Vim morar em São José em 2011. Quando surgiu a oportunidade de trabalhar no Conselho eu gostei muito, agarrei e tenho que agradecer aos cidadãos rio-pardenses que sempre me acolheram de braços abertos. Quando eu morava em Monte Azul Paulista, era assessora de imprensa do Conselho Tutelar de lá.  Eu já tinha esse gosto pela defesa da criança e do adolescente. Como sou formada em direito, já tenho certa experiência na parte de legislação. Foi algo que eu vi que seria uma oportunidade para mim e também para as crianças e adolescentes contarem com meu apoio e meu conhecimento. Fui eleita em 2015, comecei o mandato em 2016, e agora iniciei um novo mandato, que é de quatro em quatro anos”.

“O que realmente me levou a exercer a função de conselheira, é o amor ao próximo. É um trabalho muito digno em razão de ser em prol da criança e do adolescente”, relatou.

Mariana também contou um pouco sobre sua relação com a profissão. “Assim como a Priscila, também sou formada em direito, advoguei um tempo antes de entrar para o Conselho e atuei na área da infância. Quando surgiu a oportunidade de prestar o concurso, participar da eleição do Conselho, eu pensei em fazer isso por mim, e para as pessoas, em poder usar o conhecimento que eu tinha. Eu teria um desafio para ajudar a sociedade, as crianças, adolescentes e famílias, poderia contribuir e ter um aprendizado. Porque o Conselho Tutelar é um aprendizado para todos nós, aprendemos muito com as famílias, para a vida pessoal e profissional. Esse é meu terceiro mandato”.

Estrutura

O Conselho Tutelar conta com cinco conselheiros e uma secretária. Além de Priscila e Mariana, Marília Gabriela Rodrigues de Souza, Amanda Cristina de Faria Darin Ramos e Márcio Calsoni (que atualmente está trabalhando em “home office” em razão do Decreto Municipal), também preenchem o corpo de conselheiros de São José do Rio Pardo.

Em 2018 o Conselho Tutelar foi beneficiado pela Secretaria de Direitos Humanos. “Recebemos o kit do Conselho Tutelar. Ganhamos um carro, que veio diretamente de Brasília, cinco computadores, antes tínhamos só três para cinco utilizarem e eram antigos. Hoje cada um trabalha em seu computador, ganhamos uma impressora nova, bebedouro de água e geladeira. Isso ajudou muito na equipagem do Conselho”, afirmou Priscila.

Atendimento na Pandemia

“Nosso atendimento mesmo com a pandemia está sendo presencial. Estamos atendendo com horários agendados na maioria das vezes, mas se algum cidadão nos procurar, não deixamos de atender. Apesar da pandemia, nossa demanda continua grande. Estamos trabalhando bastante e fazendo o possível em prol da população”, disse Mariana.

Atualmente, em razão da pandemia, o horário de atendimento do Conselho passou a ser das 7h00 às 12h00. O Conselho Tutelar tem um plantão de 24 horas, que presta atendimento pelo número (19)98388-5599. O órgão fica localizado na Rua Ananias Barbosa, nº.38, Centro.

Violência sexual e acolhimento institucional

Priscila relatou dois dos atendimentos mais difíceis que é prestado pelo órgão. “Desde quando ingressei no Conselho Tutelar, os casos mais difíceis de atender são os de violência sexual e os de acolhimento institucional. As crianças e adolescentes afetados, na violência sexual por exemplo, irão carregar um trauma para a vida toda, físico e psicológico. Aquelas crianças que são acolhidas, que existe todo um procedimento, até o juiz da infância decidir por um acolhimento institucional, quando nos deparamos com essa situação, é algo muito difícil. Às vezes a criança volta para a família, às vezes não. Ela terá traumas. Muitas vezes acaba indo para a adoção, quando é um bebê podemos diferenciar das crianças maiores, que conhecem os pais, e que terão que conviver longe. Temos que colocar tudo em uma balança”, contou.

 “Somos seres humanos, no meu caso sou mãe, já atendi um menino da idade do meu filho que tinha sido violentado sexualmente, tive que parar várias vezes durante o atendimento, tive muita vontade de chorar. Temos que respirar muitas vezes para conseguir ir adiante. Vemos situações que não imaginamos que aconteça em nossa cidade. Vivenciamos isso e é muito difícil. Ao mesmo tempo vemos famílias que passam por dificuldades e que estão ali firmes e fortes. Aprendemos muito com isso. Tudo o que vai para o Conselho é grave, recebemos problemas”, prosseguiu Priscila.

“Temos casos de violência sexual em que a mãe coloca a filha para se prostituir. Ela é conivente com a prostituição da adolescente porque gera um lucro para a família. Não é só a questão de abuso sexual, são violências sexuais de inúmeras formas. O índice maior é dentro da própria família”, lamenta a conselheira.

Denúncias crescem

 Mariana falou sobre o aumento de denúncias que chegam para o Conselho Tutelar. “Do início do meu trabalho como conselheira até hoje, temos atualmente muito mais casos de denúncias referente a violência do que antigamente. Não é nem questão de acontecer mais hoje em dia, é que é mais denunciado. As pessoas estão tendo mais consciência e estão denunciando. Nos anos anteriores já chegamos a ter uma média de 23 casos relatados de violência sexual. Em outros anos, tivemos 10”.

Segundo Priscila, no início da pandemia, o órgão recebeu um grande número de denúncias. “As famílias não estavam preparadas para essa pandemia, ninguém estava. Até é uma questão de estruturação, os pais precisavam trabalhar, às vezes não tinham com quem deixar os filhos, o número de crianças que estavam ficando em casa sozinhas e muitas estavam ficando na rua durante o dia todo, entre outras violências que já atendíamos. Percebemos que aos poucos essas denúncias foram caindo, acredito que as próprias famílias foram se organizando, deu uma estabilizada”, destacou.

Tráfico de drogas

Segundo Mariana, crianças e adolescentes relacionados com tráfico de drogas tem tirado o sono dos conselheiros. “O número de crianças e adolescentes envolvidas com tráfico tem aumentado muito a cada dia. Nossa maior preocupação é com a questão da idade. Até um tempo atrás, tínhamos adolescentes de 15 a 16 anos envolvidos com uso ou tráfico. Hoje temos crianças com 11 anos que relatam que já fizeram uso de drogas, alguns começam até a trabalhar com tráfico. O número maior de adolescentes e crianças envolvidas em tráfico, ainda é de meninos. Já tivemos casos de meninas que chegaram até a passar por internação na Fundação Casa por tráfico, mas em número muito menor que os meninos. Mas sem dúvidas a maior preocupação é que a idade das pessoas envolvidas tem diminuído cada vez mais”, comentou.

Pais devem dar mais atenção

“Meu conselho aos pais é que prestem atenção em seus filhos, que participem mais da vida social e escolar deles. Muitos pais trabalham o dia todo, fora de casa, e deixam os filhos nesse mundo virtual, que tem muita coisa boa, mas também muita coisa ruim. Percebemos que muitas vezes os pais não sabem o que está acontecendo dentro da própria casa. Os filhos crescem rápido demais e passam por inúmeras mudanças. Ás vezes a própria criança e adolescente não sabe o que está acontecendo com ele. A família precisa estar presente, ouvindo e ajudando. Deem aos filhos mais amor e atenção do que bens materiais”, pediu Priscila.